Bandido improvisado - por Ronaldo Duran

Jornal O Norte
09/09/2008 às 10:34.
Atualizado em 15/11/2021 às 07:43

Ronaldo Duran


Professor, autor do livro Sonhar é bom, viver é muito melhor


ronaldo@ronaldoduran.com

Lá na empresa a rotina pesa. Uma reestruturação na empresa, e houve de repente uma avalanche de chefes caindo sob minha cabeça. Com a mudança da direção, uma onda de novos postos de comandos fora surgindo. Comandos delegados, ou simplesmente, apropriados indevidamente. Se já estava difícil para meu lado, ficou pior ainda. Tudo culpa minha. Se fosse mais bajulador, ganancioso pelo poder, intrometido, menos querendo executar o meu trabalho do que as palavras ditas para impressionar, eu teria garantido uma boca.

Os momentos mais gostosos do dia na repartição são dois: na hora da saída para o almoço, passear pelo centro de Jabuticabal; e na hora da volta para casa. Não que eu seja comilão. É pelo simples fato de ter o direito de respirar o ar sem falsidade que reina fora da empresa.

De volta para meu posto, o jeito é fingir o máximo estar super ocupado, pois os novos chefes que já foram muito ociosos não podem te ver parado para começar o interrogatório o que você está fazendo. Os medíocres pensam que somos robôs, temos de estar com a mão ocupada todo o tempo, que espaço para refletir sobre a ação não é direito de todo funcionário.

Se estivéssemos na linha de produção de uma fábrica, encaixotando objetos, podia-se, ainda que sem todo esse exagero, pautar uma prática mais imediatista, um pouco mais mecânica. Contudo, lidamos com pessoas. Estamos à frente de um órgão que presta serviço à comunidade. E todo serviço demanda prática e reflexão, e não atitude bestial de mostrar que estar com a mão na massa todo o tempo.

A insatisfação que acorrenta nove horas dentro da empresa naturalmente influência a vida pessoal. Péssima influência. É a intolerância com o cônjuge. Por várias vezes me vejo agressivo com esposa e filhos? A paciência que antes me caracterizava, esvaece, e quando me percebo estou mandando todos para aquele lugar.

Cabe a nós fazermos da vida inferno ou paraíso. É o que me dizem. Hoje, não vejo meios de empregar esta sugestão. Devo sair desse emprego, já que me faz tanto mal? Claro que sim. E as contas a pagar, as bocas a alimentar lá em casa? De repente se percebe que a repartição, o que deveria ser nosso sagrado emprego, se transforma na prisão mais cruel, que nos obriga aí permanecer caso queiramos viver decentemente. Mudar de emprego? Estou caçando. O desemprego assusta. Talvez por isso que muitos empregados chegam a permitir que sejam humilhados a deixar o sustento.

Essa opressão tem lado negativo para toda a sociedade. Eis aí lenha para o bandido improvisado. Aquele que oprimido na empresa, humilhados pela corja de chefes puxa-sacos ou gananciosos, involuntariamente comete atos fora da lei para aliviar tensões. Ultrapassar o sinal vermelho, correr em excesso de velocidade, aderir à pedofilia, boicotar a empresa, fazer caixa dois, agredir o companheiro e filhos, chutar o gato e cachorro, ir para o estádio de futebol para se envolver em brigas, virar alcoólatra são males que brotam de um ganha-pão opressor e inútil para o crescimento pessoal.

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