Azul sulferino - por Felippe Prates

Jornal O Norte
Publicado em 14/09/2007 às 10:22.Atualizado em 15/11/2021 às 08:16.

Felippe Prates


felippeprates@ig.com.br  



Chamava-se Zózimo Reys de Almeida.  E tinha enorme desgosto quanto ao “Zózimo”...  De vez em quando queixava-se ao pai, relacionando os problemas que encontrava na vida por ter um nome desse.



Explicava que o “Z”, por ser à última letra do alfabeto, reservava aos infelizes cujos nomes por ela se iniciavam, o resto de tudo, apenas o que sobrava, o restolho, sem aproveitamento.  Nas provas orais na escola, por exemplo, quando finalmente chegava a vez dos alunos “com Z”, os professores já estavam cansados, mal ouviam as respostas, o que sempre resultava em notas baixas.



- Agora mesmo, o professor de Português resolveu fazer uma argüição-concurso, sobre as cores existentes.  Não podem ser repetidas e todos que disserem uma cor nova, inédita, ganharão um bônus de três pontos na média mensal da matéria.  Sou o 41, o último da lista de chamada, quando chegar a minha vez será impossível lembrar uma cor que ninguém ainda falou...Vou perder o bônus...



- Vai não, Zózimo, meu filho querido!  Conheço uma cor que nenhum colega seu jamais ouviu o nome: azul sulferino!  É um tom muito raro do azul, desconhecido pela maioria das pessoas.  Vamos falar baixinho, para guardar o segredo.  Você vai brilhar e ganhar os pontos, pois ninguém, ninguém mesmo vai se lembrar do azul sulferino, antes de você.



- Ô Papai, muito obrigado!  Azul sulferino, azul sulferino, azul sulferino... maravilha!  Vou escrever o nome dessa cor na minha mão, para não correr o risco de esquecer... Ô Papai, você é o maior!  Azul sulferino, azul sulferino, repetiu à exaustão, tentando decorar bem decorado.



Chegou o dia.  Chamando o nome dos alunos pela lista de chamada, surgiram cores conhecidas e sofisticadas.  Zózimo repetia, mentalmente, azul sulferino, azul sulferino, antegozando o sucesso que faria com essa cor tão exótica.  Começando com “X” havia o Xisto, um crioulo muito falante, cheio de novidades.  Logo depois, seria a vez dele, a esperadíssima hora.  E não faltavam cores e mais cores.  O professor dizia o nome do aluno, este ficava de pé e falava a sua, obrigatóriamente ainda não lembrada.



Selma.



Verde piscina!



Thiago.



Verde musgo!



Ulisses.



Cor de rosa pálido!



Vitória.



Vermelho ocre!



Zózimo, ligadíssimo, nem piscava.  Com o coração disparado de tanta emoção, já ouvindo a música da vitória do Galvão Bueno, repetia mentalmente, sem mexer a boca, azul sulferino, azul sulferino, comemorando:  meu Deus essa é minha, ninguém tasca, essa é minha, essa é minha, vou ganhar os pontos, só eu, somente eu conheço essa cor difícil e direi seu nome...



Xisto.



A-ZUL  SUL-FE-RI-NO!



Zózimo.



PRE-TO   FI-LHO  DA  PU-TA!

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