Jorge Farinha (*)
Numa administração popular, como no caso de uma prefeitura, é perfeitamente natural que o seu administrador queira aumentar as suas receitas, e que o faça através do aumento de impostos (no caso reajuste de alíquotas). Contudo, quanto a mim, isso só é licito quando feito em cima de duas premissas: ou para manter a qualidade do serviço público prestado à população ou para poder investir em obras públicas.
O senhor prefeito, que pode ser muitas coisas, mas com certeza não é ingênuo e sabia que seria impossível justificar qualidade de serviço público, obviamente, justificou esta mini-reforma com a premissa do investimento em obras públicas.
Contudo, para enveredar por este caminho, o senhor prefeito se esqueceu, ou não, que teria que apresentar aos seus contribuintes e eleitores, uma estratégia e um plano das obras que pretenderia fazer para justificar este aumento.
Assim, creio eu que os contribuintes, mal ou bem, entenderiam e aceitariam tal medida. Tanto mais que, ao fim de dois anos de mandato em que a prefeitura não seguiu nenhum fio condutor de trabalho, onde não existiu qualquer tipo de planejamento administrativo, em que preferiu asfaltar ruas sem casas no bairro Vila Brasília e deixar bairros, como o Santa Rafaela, Olga Benário e tantos outros da periferia da cidade sem qualquer tipo de investimento e incontáveis medidas de competência duvidosa, é perfeitamente natural que a população desconfie da verdadeira intenção destes aumentos.
Diz o senhor prefeito, e com razão, que as alíquotas dos impostos estão completamente defasadas da realidade, mas também é verdade que, por exemplo, no caso do IPTU, a valorização dos terrenos, ao longo dos anos, e passadas diversas administrações, tem sido feita a 100% em cima do investimento privado e da especulação imobiliária e 0% de investimento público (com exceção dos referidos terrenos na Vila Brasília), deitando por terra sua justificativa.
Refere ainda o senhor prefeito, numa carta publicada no site montesclaros.com (http://www.montesclaros.com/mural/default.asp?numero=1299#64964), que propõe um pacto de amor a Montes Claros, mas envia tudo para ser aprovado pela Câmara, em caráter de urgência, na sua última reunião do ano (e extraordinária), sem promover qualquer debate público para o assunto. Não deu tempo. Pergunto eu: Só se lembrou em Novembro de que tinha que efetuar esta mini-reforma? Para mim isto não é amor... É estupro.
Mas, se concordando ou não, tudo isto pode ser considerado normal. Não foi infringida nenhuma lei e, a final das contas, o senhor prefeito é detentor de um mandato popular conferido democraticamente pela população montes-clarense. Ele está em exercício e tem plenos poderes e o direito de fazer estas propostas e quaisquer outras que achar oportunas.
O que já não me parece tão normal é a Câmara, na sua esmagadora maioria (14 dos 15 vereadores votaram a favor da mini-reforma), não cumpra seu papel fiscalizador e, numa medida de competência duvidosa e em caráter de urgência, aprove um pacote de medidas desta importância sem levantar qualquer questão de ordem prática.
Na ausência de uma estratégia e de um plano de ação que justifique o aumento dos impostos aos contribuintes (dizer que vai aumentar impostos para aumentar as obras públicas não é uma estratégia), o que a nossa Câmara fez foi passar um cheque em branco para o prefeito gastar esse dinheiro da forma que achar por bem.
É bom que a população comece a estar de olho naquilo que é seu e começar ela mesma a fiscalizar o que estão a fazer com os seus bens. Porque se não o fizer, a classe política (eleita), com raríssimas exceções, não o fará com certeza.
Vice-presidente do Cerradania – Centro de referência, apoio e defesa da cidadania. Presidente da Associação comunitária de moradores do bairro Santa Rafaela. Conselheiro Arquidiocesano pela Pastoral da Comunicação
Apoiador e participante do Comitê 9840 de combate à corrupção eleitoral