Perder nem sempre é ruim

Wendell Lessa
wendell_lessa@yahoo.com.br
Publicado em 03/02/2022 às 00:22.

Vencer está em nossa natureza – caída, é verdade, egoísta, mas está e reivindica um lugar de destaque. Não gostamos de perder nunca. Há pessoas que disputam fervorosamente uma batata frita no Burguer King como algo absurdamente relevante para sua vida. Já vi irmãos brigando por causa disso e mantendo o ressentimento por muitos dias depois. Um querendo a batata do outro. As batatas são deliciosas mesmo, mas não justificam conflitos, muito menos confronto. 

O que vemos é que a briga por uma simples batatinha é apenas uma parábola dos conflitos futuros mais intensos. Investimos muito de nossas energias e recursos para vencermos nossas lutas diárias e, mais do que isso, satisfazermos nossos desejos. Há quem invista dinheiro – porque não quer correr o risco de não realizar seus desejos no futuro. Há quem invista em relacionamentos – porque não quer correr de risco de ficar sozinho. Há quem não queira perder sua imagem, por isso mente e se dissimula na tentativa de construir uma ilusão de si mesmo para as pessoas – as redes sociais estão repletas desse fenômeno: gente que é perfeitinha apenas nas fotografias. 

Não queremos perder as discussões, os argumentos, a aceitação de pessoas. Somos mestres em agradar a nós mesmos e também em agradar as pessoas, mas sempre porque desejamos ser os bajulados. Gostamos de concordar com a maioria, porque isso nos faz ser aceitos no grupo. Não concordamos com a ideia, mas fingimos concordar para sermos considerados pessoas pacíficas, mansas e simpáticas. Às vezes até lavamos nossas mãos, como Pilatos, para não nos envolvermos com as intrigas alheias – e nos esquecemos de que, muitas vezes, calar é dizer. O silêncio fala. E às vezes fala alto. O ponto é que queremos sempre ganhar. Perder jamais. 

Todavia, no fundo há uma ilusão nisso. Perdemos sempre que desejamos ganhar sempre algo que não se deve ganhar. Jesus disse que para ganhar temos de perder: “Pois, que adianta ao homem ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma?” (Marcos 8.36). Quando Paulo escreveu aos romanos dizendo que “em todas essas coisas somos mais que vencedores” (Romanos 8.37), ele estava se referindo às ameaças de perdermos nosso relacionamento com Deus. Nosso relacionamento com Deus é mais importante do que qualquer outra coisa que queiramos possuir nesse mundo.

Não são poucas as ameaças que nos tentam afastar desse propósito principal. Existem acusações, tribulações, muitas angústias, às vezes privações financeiras que geram fome; há perigos de criminosos com armas (espadas); ação do próprio inimigo de nossas almas, o diabo, que nos tenta e pretende nos anular em relação ao Senhor. São muitas as adversidades. E muitas as vozes que gritam em nossos ouvidos para tentar nos levar para longe de Deus.

Paulo, entretanto, usa o argumento mais perfeito de todos e que constrói a base singular para o evangelho: Deus é que nos sustenta e preserva, e demonstrou esse amor realizando uma obra impensável: entregou seu próprio Filho para morrer por estes a quem ele amou: “Se Deus é por nós, quem será contra nós? Aquele que não poupou o seu próprio Filho, antes, por todos nós o entregou, porventura, não nos dará graciosamente com ele todas as coisas?” (Rm 8.32). Observe que o argumento paulino é infalível: quem entrega o próprio Filho não permitirá que os seus demais filhos se percam. 

Por essas razões, aquele que tem um relacionamento sincero com Deus é sempre vencedor. Ele nunca perde o que realmente importa. Não por seu próprio esforço ou mérito, mas pela preservação divina. O Senhor se compromete consigo mesmo a manter o seu povo no caminho e a manter seguro aquele a quem ele ama. Nenhum se perderá. Ninguém se perderá. Ainda que sejamos entregues à morte todos os dias (Rm 8.36), nada poderá nos separar do amor de Cristo, nosso Senhor. Se passarmos por dificuldades, elas são para nos provar e nos mostrar o que realmente importa. 

Essa é a esperança e certeza de que, ainda que passemos pelo vale da sombra da morte, Cristo estará conosco sempre. Ele nunca nos desamparará. Nunca nos deixará. Se ele é por nós, jamais perderemos nossas batalhas. Tudo pelo que passarmos será em cumprimento à vontade de Deus para nós. Então, às vezes perderemos muitas coisas nesse mundo, mas somos sempre vitoriosos. Portanto, perder nem sempre é ruim.

  

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