Catedral: quem ama cuida

Mara Narciso
23/04/2019 às 07:08.
Atualizado em 05/09/2021 às 18:20

O erro resultou em acerto, pois um projeto arquitetônico belga de igreja para Buenos Aires ou Bruxelas veio parar em Montes Claros por engano, entre 1900 e 1905. Quem trouxe a planta foi o cônego Jerônimo Lambien e, depois, a documentação se perdeu misteriosamente. A vinda da Estrada de Ferro Central do Brasil em 1926 e as desapropriações de terrenos da Igreja renderam um montante que, junto às doações da população, propiciou as obras. De 1926 a 1950 o monumento religioso brotou do chão, ao lado do cemitério.

No lugar, que depois se chamou Praça Pio XII, tem a portentosa Igreja Catedral Metropolitana de Nossa Senhora Aparecida, em estilo neogótico, com rosáceas, vitrais coloridos, rendilhados, relevos externos e três torres. A altura de seu campanário principal é de 65,08 m, o equivalente a um prédio de 20 andares. O que impressiona no templo são as grandiosas colunas de cal e areia, sem cimento, assim como seus belos altares e as imagens da boa arte, que reforçam a arquitetura.

A grande obra foi feita pelo construtor prático Francisco José Guimarães – Chiquinho Guimarães –, morto em 1940 e enterrado na igreja. A Paróquia, desmembrada da Matriz de Nossa Senhora e São José, foi criada em janeiro de 1950, com o fim das obras. Bem mais tarde, a recuperação do telhado e a nova pintura se completaram em 1990. A Catedral foi tombada em 1999 e faz parte do Patrimônio Histórico.

Anos depois da construção, ainda era possível encontrar ossos humanos nas imediações do templo. As crianças tinham medo das almas do antigo cemitério, de onde as ossadas foram deslocadas para o Cemitério Bonfim. Morando a dois quarteirões da Catedral, a família de Milena Narciso, a minha mãe, frequentava o local aos domingos. O envolvimento incluía batizados, catecismos, confissões, comunhões, missas, crismas e casamentos. Devotos frequentavam barraquinhas e leilões, doando prendas e as arrematando para dar a renda à Igreja.

Em maio, minhas tias coroavam Nossa Senhora e chegaram a usar a missa como pretexto para namoricos. Aos quatro anos, eu servia de álibi para elas. Em casa, minha mãe fazia perguntas descabidas sobre a vestimenta do namorado e eu, inocente, contava a verdade. Quando chegou a minha vez, segui o mesmo roteiro, até o casamento.

A Catedral é a Igreja-mãe da Arquidiocese de Montes Claros, sendo lugar de paz e recolhimento, ainda que a missa seja uma festa de danças e cantos. A manutenção é feita com o dízimo. A acústica sofrível, que a engenharia de som não deu solução, prejudica, mas há, em toda a nave – a maior delas comporta 3.000 fiéis - monitores para a transmissão de missas via internet.

Devido à fotogenia do lugar, vagas para casamentos são disputadas e, para se destacar, a decoração precisa ser vistosa. A Marcha Nupcial ecoa nos paredões, emocionando noivos e convidados. Quando o casamento era indestrutível, “até que a morte os separe”, torcíamos para que o amor vencesse e fosse para sempre. Quando vi a Igreja de Notre Dame se queimando, pensei em nosso monumento. Os bombeiros moram ao lado da Catedral, mas como aumentar a segurança do nosso orgulho maior?

Médica e jornalista

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