Logotipo O Norte
Terça-Feira,23 de Dezembro

Apaga-se a luz de Aracataca

Por Manoel Hygino

Jornal O Norte
Publicado em 29/04/2014 às 08:22.Atualizado em 15/11/2021 às 16:49.

*Manoel Hygino

Gabriel García Márquez não mais habita entre os vivos. Legou uma obra preciosa, esta sim perene, depois de 87 anos, encerrados no dia 17, entre as dificuldades financeiras e a glória conquistada com o Prêmio Latino-Americano de Romance Rómulo Gallegos, em 1972, e o Nobel de Literatura, dez anos após.

Em Barcelona, conheceu o escritor Mario Vargas Llosa, construindo uma amizade aparentemente sólida, desfeita em 1976 depois de 40 anos, mas sobre cuja causa nenhum dos dois falou a quem quer que seja. Nas vezes em que teve de opinar sobre o Nobel da Colômbia, o peruano foi extremamente elegante, respeitoso e elogioso.

Sobre Aracataca, terra natal de Márquez, o colega disse que “não é um povoado perdido, sufocado no calor e esquecido por Deus e os homens, entre os desertos, o mar e as montanhas”. Ali, o autor de “Cem anos de solidão” escutara quando criança, da boca da avó e outras moradoras do lugar, grandes conversadoras, papos e fofocas, maledicências e fantasias, que serviram para amassar suas fabulosas invenções.

Pode parecer que ali nada acontecera, que o clima abafado transformou as pessoas em indolentes, cuja ocupação principal era tirar uma soneca, de preferência numa rede, após o almoço, ou tomar uma cerveja gelada no boteco da esquina, ouvindo salsas e ballenatos. Falsa ideia: “Aqui todo mundo, velhos e jovens, homens e mulheres, anda ocupadíssimo, fazendo o quê? Ora, sonhando, fantasiando, inventando. Na verdade, se entram na verdadeira Aracataca, a do sonho, comprovarão que somos lindíssimos, as mulheres e os homens mais prósperos de todo o planeta. E, também, os de existência mais inquieta, surpreendente e luxuosa.”

Para Llosa, “Cem anos de solidão” foi um acontecimento literário excepcional, com o mérito de apresentar-se, simultaneamente, como tradicional e, moderno, americano e universal. Em resumo, um livro admirável. E o autor? Um colombiano, “nascido em Aracataca, um vilarejo da costa que no início do século XX conheceu a febre, o auge da banana e depois a ruína econômica, o êxodo de seus habitantes, a morte lenta e sufocante das aldeias do trópico.

De 6 de março de 1927, a este abril de 2014, Márquez mostrou o que podia ao recordar as reminiscências da avó e das demais faladeiras de seu lugarejo. Valeu a pena. A humanidade aprendeu os tempos gloriosos e os difíceis de Aracataca, contados pelo escritor amigo de Fidel Castro, que aparentemente não se deixava convencer por suas ideias, tese hoje contestada por outros autores.

Jornalista, seus livros condensam reportagens escritas ou apenas ideadas, a serviço de órgãos de comunicação de seu país, bem como da agência cubana Prensa Latina, de que foi correspondente em Nova York. Andou pela Europa, passou necessidades, mas conseguiu entregar ao público “a mais alta criação literária americana dos últimos anos”, na expressão de Llosa. Consagrado, morreu no México, onde viveu as três últimas décadas, ao lado da esposa, Mercedes, “uma bela moça de traços egípcios”, com quem se casara na Colômbia em 1956.

Compartilhar
E-MAIL:jornalismo@onorte.net
ENDEREÇO:Rua Justino CâmaraCentro - Montes Claros - MGCEP: 39400-010
O Norte© Copyright 2025Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por