Amelinha...

Jornal O Norte
Publicado em 19/07/2010 às 09:38.Atualizado em 15/11/2021 às 06:33.

Haroldo Costa Tourinho Filho


ha-tour@hotmail.com



nullSegunda-feira, 12.07.2010, 11h30. Ao telefone o amigo.irmão Ucho Ribeiro foi breve: “Uma de suas mães morreu.” Minha cabeça foi a mil. Júlia Guedes já se fora... Dona Jacy, nossa mãe? Não, apesar da voz embargada, a terrivel notícia não seria transmitida por ele. Madá? Dona Marina? Falamos ao mesmo tempo: Amelinha...



Amélia Prates Barbosa Souto viveu sua infância e adolescência na praça da Matriz. Filha de tradicional família política, Prates, atuantes nacionalmente através dos deputados federais de seguidas legislaturas Milton e Camilo. Antônio Gonçalves Chaves*, filho do cônego Chaves e seu antepassado, chegou à presidência das províncias de Minas Gerais e Santa Catarina.



Falar sobre Amelinha é fácil. Carreira vitoriosa: professora, diretora de escola (grupo escolar Gonçalves Chaves), política, escritora (membro da Academia Montesclarense de Letras)... Aqui, eu gostaria de ressaltar o que nela mais me encantava: sua solidariedade para com todos, o sentido de amizade e honestidade à toda prova. Conselheira de quem a procurasse, não raro suas palavras carregadas de afeto levavam o confidente às lágrimas, presenciei isso. Sabia também, se necessário, ser brava, e como!, principalmente quando a contenda em tela a ofendia ética ou moralmente. Amélia foi uma mulher de verdade, não no sentido da letra da famosa canção, que isso ela não era, pelo contrário.



Revelou-se ainda mais como mãe após o trágico desaparecimento de seu amado José Veloso Souto. Com três dos seis filhos ainda menores (um sétimo, Gustavo, morrera aos seis meses), venceu todas as vicissitudes e os educou exemplarmente. Nesse quesito não transigia, embora respeitasse as idiossincrasias de cada um.



Tomei um banho rápido e desci para o velório. Na entrada seu neto Camilim me abraçou. Ao me deparar com Amélia, o choque: quem a colocara ali? Amélia estava viva, que brincadeira de mau gosto era aquela?



Trajada elegantemente, levemente maquiada, o carmim dos lábios, brincos, anéis e pulseiras usuais... Uma imagem me assaltou: Cleópatra! Porém, os soluços e lágrimas dos circunstantes fizeram-me cair na real: sim, minha amiga e mãe havia partido.



Saí para fumar, pensar, procurar entender aquela fatalidade. Uma delegação de alunos do grupo escolar Francisco Sá, onde ela lecionara, adentrou o recinto. Outras, do Gonçalves Chaves, do qual fora diretora, se sucederiam ao longo da triste tarde. Divisei seu filho, Júnior, e fui ao seu encontro. Nos abraçamos e nada falamos, pois não havia o que falar. João Avelino acercou-se de nós e logo em seguida Rossini Viana, genro de Amélia, que nos relatou todo o sucedido. Amélia viajara a Barbacena em sua companhia para a formatura da neta Fernanda em medicina. Na volta, ainda na estrada, sentiu-se mal...



Coroas de flores não paravam de chegar. Outro cigarro. Sentei-me com os dois Leos, Malveira e Ogando e perguntei por Murilo, filho de Amélia residente em Londres. Não viera. Estivera com a mãe três meses antes, quando ela sofrera a primeira embolia pulmonar. Nessa ocasião fora por ela advertido de que se algo pior lhe ocorresse, que ele permanecesse na Inglaterra, “pra que gastar dinheiro quando nada mais pode ser feito?” Murilo obedeceu. E quem ousaria desobedecer a matriarca?



Rimos, os três. Chega Virgínia de Paula, pergunto-lhe sobre o lançamento de nosso livro - Éramos felizes e sabíamos - em Moc. Será em agosto, durante a festa dos catopês. A academia está de luto, ela nos disse, referindo-se à acadêmica que acabara de nos deixar. Amélia foi uma escritora nata. Poderia nos ter presenteado com vários livros, mas concentrava-se em poemas e crônicas publicadas nos jornais locais, nas quais tecia considerações sobre os mais variados assuntos. Coube a mim digitar alguns desses textos em seu computador. “Só sei pensar com a caneta”, dizia ela. Cerca de dois anos atrás lançou três livros de uma vez. Livros infanto-juvenis, simples e edificantes.



Abraçei seu outro filho, Luciano, e ficamos aguardando a chegada de Olga Maria e Claudinha, suas irmãs. Danuza eu já abraçara ao lado da mãe. O neto João me puxou e disse: “Como serão agora os nossos natais?” Confortei-o: “Serão um pouco diferentes, claro... Mas se em todos os natais nos lembramos de Zé Souto, agora nos lembraremos dos dois...”



Finalmente, a hora da verdade. Partimos em cortejo para o Campo Santo. Amélia foi saudada em discursos de sua neta Ludmila, de um senhor de quem não me recordo o nome e da nossa querida presidente da Academia Montesclarense de Letras, a querida dona Ivone Silveira que, aos 95 anos, ainda possui aquela firmeza na voz. Orações e cantos religiosos emolduraram toda a cerimônia.



O que mais posso dizer sobre Amelinha? Ah, ia me esquecendo do seu denodado trabalho em prol da Sociedade de São Vicente de Paulo. Descanse em paz, minha boa amiga. Católica fervorosa e devota amantíssima de Nossa Senhora de Fátima, esta certamente lhe disse ao se encontrarem: “Valeu, Amelinha!”



* ANTÔNIO GONÇALVES CHAVES


Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.



Antônio Gonçalves Chaves (Montes Claros, 16 de setembro de 1840 — 28 de novembro de 1911) foi um político brasileiro. Bacharel em Direito (São Paulo) em 1863.



Foi presidente da província de Santa Catarina, nomeado por carta imperial de 23 de junho de 1882, de 6 de setembro de 1882 a 27 de janeiro de 1883, transmitindo o cargo ao vice-presidente Manuel Pinto de Lemos, que completou o mandato em 28 de fevereiro de 1883. Foi também presidente da província de Minas Gerais, de 1883 a 1884.



Foi juiz de Mariana em 1889. Já sob o regime republicano foi deputado constituinte, e senador de 1894 a 1902, sempre por Minas Gerais.



Foi o segundo diretor da Faculdade Livre de Direito de Minas Gerais (atual Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG), ainda na então capital de Minas, Ouro Preto. Foi antecedido pelo Conselheiro Afonso Pena e sucedido pelo professor Francisco Mendes Pimentel.

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