A transposição das águas - por Dario Teixeira Cotrim

Jornal O Norte
Publicado em 12/12/2007 às 11:00.Atualizado em 15/11/2021 às 08:26.

Dario Teixeira Cotrim 



Riacho do Navio corre pro Pajeú/ o Rio Pajeú vai desaguar no São Francisco/ e o Rio São Francisco vai bater no meio do mar... (Luiz Gonzaga)



 


A transposição das águas do Rio São Francisco para o grande sertão ressequido dos outros estados nordestinos continua sendo o sonho acalentado de gerações passadas para as atuais e futuras gerações. Se analisadas criteriosamente todas as formas intrínsecas das idéias iniciais para a transposição do rio São Francisco, veremos que este projeto será um feito de grande importância para redimir o sofrimento do povo sertanejo, isso desde que os interesses políticos não se façam presentes no seu bojo.



Entretanto, é bastante notório à rejeição de alguns bons políticos sobre a realização da transposição – o que não se discute é a necessidade do abastecimento de água para a região do semi-árido – mas a oportunidade da existência de corrupção, uma vez que os filiados do PT estarão se intrometendo nos resultados das concorrências públicas e, com isso, levando vantagens financeiras em detrimento dos prejuízos que irão causar aos cofres públicos. Infelizmente não podemos acreditar nas artimanhas do PT. Não podemos porque...



A seca do Nordeste antes mesmo de ser perversa ela é uma indústria bastante lucrativa.



Por outro lado o sertão é independente apesar de suas carências. É majestoso nas suas fraquezas e coerente com as suas formas e, também, com os seus seres viventes. Não foi por acaso que o ilustre escritor Euclides da Cunha disse na sua primorosa obra literária, Os Sertões, que o sertanejo é antes de tudo um forte! Agora o governo federal quer mudar essas características sertanejas. São mudanças inerentes somente ao grande rio, chamado de Unidade Nacional, esquecendo-se que existe uma co-relação, de suma importância, entre o homem-sertanejo e a natureza em que ele vive. Um rio que nasceu para correr em seu leito original não pode sofrer mudanças tão bruscas como as que estão querendo lhe impor. Primeiro é preciso educá-lo antes de conduzi-lo para outros caminhos. Se os políticos não se emendam, emendarmos os rios não seria uma boa solução? Nas idas e vindas do majestoso São Francisco, depois de despencar-se da Casca D’anta e de se transpor, de sobressaltos em sobressaltos pelo belo e espremido cânion alagoano, o rio suspira aliviado e desemboca orgulhosamente nas ondas do mar. Mas este espetáculo está com os seus dias contados.



A greve de fome do bispo Luiz Flávio Cappio não sensibilizou o governo federal. Por isso ele volta à greve. Não o sensibilizou porque o governo não tem consciência dos erros que está praticando contra o mais sofrido dos rios brasileiros. A ignorância de um homem despreparado lhe tolhe o nexo do que é certo e do que é errado e assim o rio sofre. Se o rio está morrendo, a imprudência humana apenas contribui para a sua morte imediata. O maior erro desses políticos é querer iniciar uma obra faraônica em um período eleitoral, se esquecendo que o principal agora seria a vitalizar as suas nascentes ainda perenes, principalmente as dos seus afluentes intermitentes e não a transposição de suas águas, como quer o governo federal.



O São Francisco é um mundo, disse o eminente historiador Wilson Lins, nasce na Serra da Canastra, em Minas Gerais , percorre cerca de setecentas léguas e deságua no mar. Também observa o engenheiro Geraldo Rocha quando afirma que o Rio São Francisco é o fator precípuo da existência do Brasil. Ora, o Nilo brasileiro que hoje arrasta milhões de toneladas de entulhos das grandes cidades, principalmente de Belo Horizonte, via rio das Velhas, pode em porco tempo virar entulho. A natureza presta um grande serviço para a humanidade, mas o homem está tirando dela mais do que ela pode nos dar. A exploração demasiada dos recursos naturais que o rio São Francisco nos oferece pode levar ao esgotamento de suas águas, na perda de sua biodiversidade e vir depois a morrer sufocado na concentração de gás carbônico na atmosfera que lhe cerca.



Disse o ilustre Rui Barbosa na Conferência de Alagoinhas, em três de dezembro de 1919, que o “sertão não conhece o mar. O mar não conhece o sertão. Não se tocam. Não se vêem. Não se buscam” senão pelo cânion do rio São Francisco. Também disse os cantores, Sá e Guarabira, que o sertão vai virar mar/ dá no coração/ o medo que algum dia o mar também vire sertão... Fiscalizar a degradação do Rio São Francisco é dever de todos nós.

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