Manoel Hygino *
Eugênio Gudin, ínclita figura da República deste país, viveu em torno de 100 anos. Foi o primeiro grande economista brasileiro, que inclusive professou no ramo, sem jamais ter recebido um diploma na profissão.
Caminhando para o centenário, lúcido, confessava que, todos os dias, seu primeiro cuidado era ler a página de necrológico de seu jornal carioca preferido, para saber se ainda estava vivo.
Acho que todos os idosos, os macróbios, deveriam seguir-lhe a lição, para não serem apanhados de surpresa. Enfim, não deve ser agradável despertar, pela manhã, e constatar que se morreu.
Foram estas as primeiras emoções quando li “O Norte de Minas”, e página do Hoje em Dia, relacionando nomes dos “150 montes- clarenses que a história jamais esquecerá”, publicação, ao ensejo do sesquicentenário da cidade norte-mineira. Lá está o meu nome, “o maior escritor montes-clarense vivo”.
Repito: “vivo”, logo, existo ainda.
Tais provas de generosidade comovem, porque a cidade em que nasci já produziu notáveis homens para o mundo das letras, e muitos estão ali trabalhando, em silêncio.
Escolheram-se 150 pessoas que, na opinião dos eleitores, foram as ilustres de toda a história da cidade. Pode parecer um número extenso, mas, em verdade, não se admitiria que pelo menos um cidadão, por suas virtudes e méritos, não merecesse a distinção, a cada ano transcorrido na história cotidiana.
Vejo-me, assim, alinhado a pessoas de alto valor pessoal e para a comunidade, homens que honram a terra em que nasceram ou em que mourejaram. Alguns não mais estão entre nós, mas é motivo de orgulho e vaidade sabê- los nossos contemporâneos.
O jornal promoveu as mais candentes demonstrações de apreço aos eleitos, através de um ampla consulta, por cartas e e-mails, o que valoriza a iniciativa e engrandece os agraciados. O Jornal “O Norte” promoveu a entrega de troféus e certificados, além de diplomas alusivos à data e à promoção. Aqui, sim, a palavra “evento” pode ser utilizada na sua verdadeira e correta acepção.
São pessoas vivas, embora não estejam muitas mais entre nós. O que fizeram em favor de uma comunidade, cada uma por meio de seu instrumento de trabalho, ultrapassou os tênues limites do tempo.
A lista abrange gente simples, que deu um caráter muito genuíno ao projeto do sesquicentenário. Daqui outros 150 anos, o fato será lembrado e os homenageados merecerão o preito de saudade.
Daqui a pouco, todos seremos pó, revertendo ao que éramos em origem. Entanto, manifestações assim dão idéia de perenidade, que não é unicamente de quem recebeu a homenagem, mas de uma coletividade conhecedora de sua alta destinação histórica.
É dignificante e alentador contar com a amizade e o respaldo daqueles junto aos quais nascemos e nos formamos, para assumir as graves responsabilidade de ajudar a construir e dar continuação ao legado dos ancestrais. A vida não se extinguiu com as gerações pretéritas, e estamos lutando para que as deste nosso tempo unam os fios da cronologia para transmitir um patrimônio enriquecido aos que vieram após.
A comemoração foi uma homenagem também ao passado. Só somos os que somos porque tivemos raízes, em uma cidade que o grande estadista Francisco Sá considerou “milagre do sertão”. Todos nós, os que já partiram, os que cá estão agora, e os que nos sucederam fazem parte deste milagre, desta história.
Extraído do jornal Hoje em Dia
* Jornalista e escritor
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