A luta entre dois direitos

Jornal O Norte
Publicado em 26/01/2011 às 11:03.Atualizado em 15/11/2021 às 17:20.

Inexiste brasileiro que não se revoltou com o régio presente de Natal que os deputados e senadores se deram, reajustando seus salários e também o do presidente da República, do vice e dos ministros.





Reajustes que vão de 61,8% a 146,6%. Tudo votado de maneira relâmpago, no apagar das luzes de 2010. Estas coisas atrevidas e escandalosas devem mesmo ser feitas no escuro, depressa, sem balbúrdia, alarde ou discussão.





Satisfeitos, evidentemente, ficam todos os que se beneficiarão deste novo ataque ao erário, praticado pelos nossos ilustres representantes no Congresso. E escolheram um momento realmente propício para mais uma demonstração inequívoca de desrespeito ao povo brasileiro: o salário mínimo chegou a minguados R$ 545, foram necessários cortes no orçamento para 2011, os aposentados continuam chorando sobre seus minguados vencimentos, a inflação está pondo garrinhas de fora e os professores estão na ordem do dia, ganhando agressões, aviltamentos e até a morte em troca de humildes vencimentos.





Há quem proteste com mais realidade e dureza. O bispo Manuel Edmilson da Cruz recusou a Comenda Direitos Humanos Dom Helder Câmara oferecida a ele pelo Senado por ter se destacado em favor dos direitos humanos.





Seu protesto foi veemente. Em discurso no plenário da casa disse, entre outras: ”...é um atentado, uma afronta ao povo brasileiro...”. E mais, digno de nota: “O povo brasileiro, hoje de concidadãos e concidadãs, ainda os considera parlamentares? Graças ao bom Deus há exceções, decerto, em tudo isto. Mas excetuadas estas, a justiça, a verdade, o pundonor, a dignidade e a altivez do povo brasileiro já têm formado seu conceito. Quem assim procedeu não é parlamentar. É para lamentar...”.





Parabéns, bispo Edmilson. O senhor teve a coragem de aproveitar a ocasião para reagir e mostrar uma insatisfação que é de todos os brasileiros. E, caro leitor, quando alguém lhe disser, – vá queixar-se ao bispo – vá mesmo (com todo o respeito). Sua voz pode encontrar ressonância...





O que tem também provocado reações e trabalho para a Justiça são os bônus e cotas para ingresso de jovens nas universidades. Um número considerável de alunos,  provindos de escolas públicas, tem garantido seu lugar nas instituições, assim como os que se declaram negros ou pardos. Em Belo Horizonte, um aluno ingressou na Justiça sentindo-se prejudicado no vestibular de Medicina. Entre os 74 candidatos aprovados, 42 deles valeram-se do benefício do bônus. E descobriu-se, então, que vários tinham alto poder aquisitivo e cursaram o mesmo cursinho pré-vestibular do candidato prejudicado. O caso tramita na Justiça.





Um casal de atores negros, famosos no Brasil pelos seus trabalhos no cinema e na TV, espera alegremente um filho. O casal é rico, abençoado pelo talento, culto, tem situação social e cultural invejável, tudo mercê de sua luta e esforço, assim como tantos outros que não são negros ou pardos. Seu filho merecerá, em função da cor, ser agraciado pelo sistema de cotas, diferentemente de outros jovens que decididamente tiveram menos oportunidades na vida?





Não estou aqui emitindo juízo de valores, apenas apoiando o reagir de quem se sente injustiçado. Afinal, o drama não é a luta entre justiça e injustiça. É a luta entre dois direitos igualmente justos.


 

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