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Sábado,20 de Dezembro

A insustentável leveza da loucura

Por Cláudia Gabriel

Jornal O Norte
Publicado em 21/02/2014 às 04:23.Atualizado em 15/11/2021 às 16:45.

*Cláudia Gabriel

Luz vermelha... E ele entra em ação. Os carros param. Quem chega não é vendedor de balas ou lavador de vidros nem o homem que brinca com o fogo. Este é diferente porque não pede nada em troca. Quer apenas se exibir, e o espetáculo é surreal. Vestindo apenas uma sunga azul, faixa do Brasil na cabeça, ele se estica no asfalto quente. Faz alongamentos, ensaia alguns saltos. E não troca olhares com ninguém. No seu mundo paralelo, parece não haver motivo pra interagir. O sinal verde traz um instante de lucidez. Ele sai meio sem graça, encosta-se num poste e fica ali à espera da próxima apresentação. Já vi este homem na avenida Bias Fortes e, agora, na rua da Bahia. Mas foi nessa última aparição que tive vontade de escrever sobre a loucura.

E aí me lembrei de uma mulher em Juiz de Fora que dançava na porta das lojas de discos. Sim, discos do tipo LP... Eu era criança e ainda não se vendia CD. Isso faz tempo e denuncia minha idade! Vestido branco de renda, batom vermelho intenso, borrado. No centro da cidade, bem no Calçadão, um show gratuito que despertava, no mínimo, curiosidade. E que podia durar horas...

É, a loucura surpreende. Foi o que pensei ao encontrar o homem de sunga. Até então, era só uma frase solta. Quando cheguei à minha casa, liguei a TV e, numa triste coincidência, vi que existe outro tipo de loucura que assusta e que pode ser muito perigosa. Foi o dia em que Wellington Menezes de Oliveira matou 12 crianças no Rio de Janeiro. Eu olhava aquilo tudo sem acreditar. A partir da carta que ele deixou, especialistas agora estudam a personalidade, falam em delírio. O nome científico pouco importa quando o resultado é uma tragédia. E nem preciso dizer quantas outras histórias dramáticas foram provocadas porque alguém saiu do seu juízo. O que sempre me intriga, nesses casos, é como a pessoa, até então inofensiva, perde o controle sobre a própria vida.

Mas o que eu pensava a caminho de casa, antes de saber dessa notícia, era na loucura criativa dos artistas, na loucura da paixão, na loucura dos cientistas e dos gênios. Eles também vivem universos paralelos quando mergulham na descoberta que ninguém mais enxerga. Era sobre isso que eu queria falar quando vi o homem do asfalto. Algo leve e curioso.

No fim deste texto, é estranho concluir que misturei coisas tão diferentes porque tudo ocorreu no mesmo dia. A loucura que pode ser mansa e o descontrole extremo e doentio. Nem sei se a mesma palavra poderia ser usada para definir os dois lados e não atribuo qualquer conotação negativa quando falo dos “loucos”. Afinal, nós, que nos achamos tão lúcidos, aos olhos dos outros, também temos nossas esquisitices...

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