Violadores do outro

24/02/2021 às 00:09.
Atualizado em 05/12/2021 às 04:15

A pandemia da Covid-19 trouxe com ela o isolamento social. Se por um lado o distanciamento evita o contágio e a propagação do vírus, provoca o crescimento de graves distúrbios sociais. A violência contra o idoso foi um deles, como indicam números do Disque 100, ligado à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. De acordo com a Secretaria, em 2020, entre os meses de março a abril, a violência contra os idosos cresceu 59% se comparado ao mesmo período de 2019. Sem contar as subnotificações, já que muitos não denunciam aqueles que os violentam pela forte ligação afetiva.

Essa afetividade salva os agressores e destrói quem os ama. Inimaginável que estas pessoas, que chegam à velhice sonhando com cafés da tarde ao lado de filhos e netos, almoços de domingo regados a ternura, receba de volta violência, em qualquer das duas formas. Eles, que trabalharam a vida inteira e que muitas vezes continuam arrimo da família, mesmo em idade de apenas desfrutar o que construiu em 60, 70, 80 ou 100 anos, passam dias e noites sendo ignorados, maltratados, negligenciados em seus direitos básicos de seres humanos, sem uma cama pra dormir, um prato de comida para se alimentar, um local adequado para as necessidades fisiológicas.

Se as mulheres perderam o medo e estão denunciando cada vez mais a violência contra elas, a violência contra os idosos permanece camuflada. Por medo da solidão, do abandono, por medo de não se sentirem amados ou mesmo por não terem meios de realizar a denúncia, estas não se concretizam. E então, essa violência, essa falta de respeito segue crescendo. Fragilizados, eles acabam acreditando que merecem esse tipo de tratamento e, não raro, sucumbem à tristeza de terminar a vida na solidão, embora cercados por quem amam. 

Que a sociedade reaja contra esses violadores, com leis mais rígidas, com punições mais severas, mas, sobretudo, com ferramentas que protejam efetivamente os nossos idosos, ferramentas que permitam a eles denunciar sem medo, sem dor... Que jamais percamos a sensibilidade, com pandemia ou sem pandemia, que nos faz lutar pela dignidade do outro, sob o risco de perdermos a nossa própria dignidade durante a caminhada. Cuidar do outro é cuidar de nós.

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