Bom de bola e bisturi

Mara Narciso - Médica e jornalista
21/05/2019 às 06:28.
Atualizado em 05/09/2021 às 18:44

É um nome de livro, porém, mais se parece um verso de música popular para jogador  de  futebol.  Eu, que sou dada a ousadias, faço um elogio a um livro  de elogio. Bom de bola e bisturi é uma homenagem  de Manoel Hygino dos Santos, historiador da Santa Casa de Misericórdia de Belo Horizonte, ao médico  de Sabará, radicado na capital, Dr. Lucas Monteiro Machado. Nascido em 11 de novembro de 1901, foi um dos criadores do América Futebol Clube no qual jogou como meio-campista até os 23 anos, quando estava no 5º ano de Medicina. Também no dia 11 de novembro, mas em 1950, Lucas Machado criou a Faculdade de Ciências Médicas, onde foi professor catedrático. A Faculdade de Medicina jamais pôde ser dissociada da Santa Casa de Misericórdia de Belo Horizonte, que completa 120 anos.

Sócio efetivo da Academia Mineira de Letras, Manoel Hygino dos Santos teve sorte em sua pesquisa, pois encontrou grandes literatos, capturou seus escritos e os selecionou em sua obra. Quem quiser ampliar seu vocabulário em adjetivos, poderá destacá-los da biografia de Lucas Machado, médico de dicado à área da Ginecologia e Obstetrícia, e que, mesmo adepto da humildade, mereceu diversas reportagens nos jornais da época. Muito se escreveu a respeito desse cidadão sorridente e de olhos azuis, que deixou sua marca humanista em tudo que fez. Respeitado pelos colegas, profissional tão brilhante quanto seu preceptor Hugo Werneck, trabalhava sem distinguir a classe social das clientes, falando com elas de forma respeitosa e dando tudo de si para obter o melhor resultado.

Num tempo de pobreza e falta de informação, em que o nascimento, após um longo trabalho de parto, era feito por parteiras, as fístulas vesico-vaginais eram comuns. O Dr. Lucas Machado aperfeiçoou técnicas cirúrgicas curando essa condição trágica de incontinência urinária. Integralmente dedicado à profissão, passava dias sem ir a sua casa e quando retornava, chegava tarde da noite. Ainda assim, comunicava-se com a família por delicados bilhetes espalhados pela casa.

Foi sócio fundador e presidente da Associação Médica de Minas Gerais. Afeito à escrita literária e a contar anedotas, divertia a todos, chegando a receber de Juscelino Kubitschek entusiasmados elogios num discurso.

Pode-se criticar o livro, belíssimo em fotos e papel fotográfico, além das letras graúdas, pelo fato de ter omitido a causa da morte do médico, ocorrida em nove de agosto de 1970, ou ainda cobrar a falta de defeitos em Lucas Machado. Mesmo assim, o autor convence sobre a perfeição do personagem, por mais desconfiado que o leitor possa ser. Os filhos do ginecologista não reclamavam da ausência do pai, dando mostras de que ele não te ria sido um pai ausente.

Manoel Hygino tem dom para a História, e, com letra hábil, após profunda investigação, descreveu a grande vida de Lucas Machado. Há décadas tem feito o serviço de esmiuçar documentos da Santa Casa, falando de serviços, professores e alunos. Eu fiz Residência Médica naquele hospital durante três anos e conheci suas entranhas e muitos dos que por ali passaram. E nesse mergulho de saudade, pude constatar a importância de Bom de bola e bisturi.


 

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