Amelina Chaves, aos 89 anos

Mara Narciso - Médica e jornalista
30/04/2019 às 06:43.
Atualizado em 05/09/2021 às 18:26

O bate-papo informal de 40 minutos no Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros nos revelou a Amelina Chaves mais leve e pura de todas. Nasceu em família pobre no Sapé, distrito da cidade de Capitão Enéas, antes Burarama. Lá frequentou escola até o 4º ano primário, mas leu Monteiro Lobato, ocasião em que decidiu escrever livros.

Aos 13 anos, foi raptada pelo futuro marido, Almir Chaves, chefe de segurança da Estrada de Ferro Central do Brasil, para com isso forçar o casamento. Pequenina, mal ultrapassava a cintura do marido, e, fecunda, com ele teve 15 filhos. Bonita, de pele clara, loira de olhos azuis, trabalhou em cozinha pobre, preta de carvão, lecionou durante oito anos para filhos de ferroviários, foi costureira e ainda hoje faz e vende bonecas de pano.

O pai achava que a filha vivia com a cabeça nas estrelas, e seu primeiro livro assim se chamou: “O menino que sonhava com as estrelas”. Depois do primeiro livro, de temática infantil, passou a escrever todos os dias, e então vieram livros adultos e premiados com contos fortes como “Jesus era uma prostituta”. Emotiva, chora ao reler esse conto.

Não há censura que lhe segure a pena, nem temática impublicável para Amelina Chaves, aos 89 anos. Sempre foi assim, uma escritora inventiva, dona de uma grande coragem. Tem senso crítico aguçado, sabe das suas limitações, mas não se intimida diante dos desafios. Conclama outros autores a escrever sobre variados assuntos. Sua engenhosa concepção é interminável, e já lhe rendeu 30 livros. Diz ser rica em amigos, que são capazes de qualquer sacrifício para ajudá-la. Wanderlino Arruda viajou de avião para Brasília a fim de lhe fazer uma correção de texto e cumprir o prazo da editora.

Com sua imaginação, ganhou muitos concursos. Busca no Google a expressão “Concurso Literário”, envia seu trabalho e aguarda os acontecimentos. Resultado: é uma ganhadora de inúmeros prêmios, e com o dinheiro publica mais livros, pelo menos mil exemplares de cada edição.

Os seus admiradores ou colegas lhe tecem elogios, sem lhe fazer favor algum ao expressá-los. A Unimontes escolheu seu livro erótico “O Príapo de Ébano” para o vestibular, obra que tem final inesperado. Considera-se uma camelô de livros, uma escritora vendedora, que não se acanha de oferecer sua produção na rua, em pleno Festival Literário Internacional de Paraty (Flip). Fez livros infantis, poemas, contos, romances e biografias. Lê e pesquisa antes de se aventurar. Seu processo de criar parte de uma ideia simples, e vai se imbricando numa teia criativa e no fim, tem-se uma boa história.

Li Príapo de Ébano, Jagunços e coronéis, Os olhos da noite, O Flagelado, O livro proibido e Retrato do prazer. Seu estilo simples e direto é texto enxuto, mas não superficial. Faz análises e coloca dramas psicológicos. Na sua temática erótica, deixa transparecer que muitos dos desejos femininos são seus. Tudo é escrito ao sabor do pensamento, daí ser necessária uma revisão minuciosa. E lá vamos nós atrás de mais uma emoção.

A literatura de Amelina Chaves é um caminho de sensualidade, sentimento e paixão, ela que pretende escrever até os 90 anos, mas viverá cem, é nossa alegria e nossa voz. Uma voz alta e forte.

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