A fuga da malignidade

Wendell Lessa
wendell_lessa@yahoo.com.br
06/05/2021 às 00:37.
Atualizado em 05/12/2021 às 04:51

 Certamente há várias explicações para o mal no mundo. Justificativas sociológicas, psicológicas e religiosas são encontradas aos montes. Há, todavia, certo consenso de que o mal no mundo não habita somente certos ambientes sociais nem mesmo é particularidade de grupos étnicos ou locais específicos de uma cidade. A maldade, que é a capacidade de se praticar o mal, está presente no ser humano, assim como a bondade, a justiça, o amor e outras virtudes. 

Hannah Arendt, por exemplo, entende que o mal se intensifica quando há recusa ao pensar e à reflexão por parte do homem, o que promoverá o crescimento da maldade, uma descaracterização do homem, banalizando o mal, e tornando as sociedades humanas verdadeiros centros de expansão de horror, podendo chegar ao terror. Esse, por sua vez, promoverá os regimes totalitários.

Na perspectiva bíblica, a maldade humana é uma das consequências da queda. Esse fenômeno ao qual os teólogos denominam “queda” está fundamentado na narrativa de Gênesis 3.1-24, de modo mais específico o versículo 6, que descreve o ato de desobediência pactual. 

Deus havia ordenado a Adão e Eva que não comessem do “fruto proibido”. Todavia, tentados pelo desejo desordenado, a cobiça, ambos comeram e assim se tornaram culpáveis do princípio de obediência requerido. 

Assim sendo, caíram de um estado original de graça, no qual usufruíam de liberdade de vontade e decisão e de um relacionamento afetivamente puro com Deus, o Criador. E por essa “queda”, Adão e Eva e todos os seus descendentes (nós seres humanos) perderam seu caráter de pureza e passaram a cultivar e demonstrar os vícios mais destrutivos. Isso ficou muito claro no episódio do assassinato de Abel, motivado unicamente pelo desejo desordenado da cobiça invejosa de Caim. 

Tomando a narrativa de Gênesis como parâmetro, todos nós somos caracteristicamente como Caim: descendentes de Adão que demonstram desejos desordenados, sempre motivados pelo desejo de governar sua própria história, uma clara autonomia em relação ao Criador. 

O fato é que a maldade pode ser vista diariamente, desde corruptos e corruptores de ternos e gravatas que roubam milhões da saúde e da educação, até aqueles que invadem creches e matam crianças com facas e fogo, que espancam os próprios filhos, abusam de bebês e cometem as mais terríveis e abjetas atrocidades.

Seja o que for e como for, o mal existe e a maldade está presente dentro de cada um de nós. Se permitirmos que nossos desejos desordenados se sobressaltem além do que deve ser refreado e disciplinado em nós, a malignidade se tornará insuportável.

É preciso refrear a maldade por meio, sobretudo, da reflexão sobre quem nós somos e do retorno ao Criador.

A busca da autonomia desenfreada a parte do Criador é sempre um caminho de emancipação perigosa. Se a bondade perfeita está no Criador, é para ele que devemos retornar.

Diferentemente de Adão, que se afastou e fugiu do Criador, mentindo sobre onde estava e o que fizera, nosso caminho de volta não deve demorar, a menos que queiramos experimentar o totalitarismo da malignidade.

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