A mídia e o crime

Oswaldo Antunes, jornalista
03/06/2017 às 11:50.
Atualizado em 15/11/2021 às 06:14

Há alguns anos, os órgãos de comunicação constataram que o numero de suicídios estava ligado à divulgação dos casos ocorridos. Decidiram não fazer a divulgação desse tipo de morte e os suicídios diminuíram. Porque os suicidas eram simplesmente imitadores.

No crime imotivado essa capacidade de imitação é incontrolável. As chacinas são sempre sem motivo justificável; o seu fim último é, também, o suicídio, acrescido geralmente do desejo de notoriedade pós-morte.

Massacre de crianças inocentes não tinha registro no Brasil. Chegou, e com sintomas de repetição que refletem influência do noticiário sensacionalista e repetido.
Embora a sociologia criminal advirta que não se deve divulgar sequer o nome do indivíduo que comete esse tipo de crime, no caso de Realengo viu-se o contrário: o criminoso ficou famoso após a morte, até com repercussão mundial. E a iniciativa de atender o desejo criminoso foi da própria policia, com pericias técnicas que obtiveram e propagaram fotografias mórbidas e relatos macabros. Até filmes que ensinam matar e depois morrer foram mostrados.

Mas a polícia não conseguiria esse mal sem a colaboração da imprensa. Longe a intenção de ferir a liberdade de informar, mas é preciso dizer que é agora o momento de encontrar o modo correto de noticiar casos como esse, caso venha a repetir-se. Encontrar o modo de dar a notícia sem causar conseqüências subliminares, aquelas que atingem indistintamente e se estratificam no inconsciente coletivo.

A mídia, mais do que direito, tem o dever de ensinar. Mas não ensinar a cometer crimes. Não mostrar aos criminosos em potencial o caminho da justificação de delitos sem motivo. Não incentivar a falta de controle, porque massacre de inocentes é ato incontrolável por ser também um ato de suicídio. É verdade que a internet foi envolvida; mas ela só não daria a desejada notoriedade após a morte que teve o monstro de Realengo.

Há ainda que pensar em uma possível conca-tenação dos alardeados e falsos motivos com o uso de drogas.

Alguns dias após o massacre esteve em evidência o pânico ocorrido na cidade mineira de Divinópolis, quando um adolescente de 17 anos, usuário de drogas, (a informação é de sua própria mãe), viu um programa de televisão que falava do assassinato coletivo e manifestou a intenção de praticar o mesmo crime na cidade onde mora. Ele repetiu exatamente o que viu e ouviu no noticiário: “Eu vou pegar um revólver, matar um tanto de gente e depois me suicidar”.

A sociologia criminal é ciência recente, nascida da influência do meio social sobre a prática delitiva. Ela afirma, de modo até certo ponto pessimista, que não existe sociedade sem crime quando interesses sensacionalistas são acolhidos e propagados. A mídia ajuda a formar um viés coletivo de agir e pensar que deve ser bom, mas pode não ser a cada momento do tempo. Seu poder é imperativo e coercivo, maior do que se imagina ao ler uma notícia.

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