Os ‘poucos’ e os ‘muitos’ na literatura

Wendell Lessa
wendell_lessa@yahoo.com.br
17/12/2020 às 00:01.
Atualizado em 27/10/2021 às 05:19

Um experimento na crítica literária é um presente memorável com o qual Lewis nos brinda, oferecendo-nos um caminho seguro na experiência subjetiva com a literatura. Nascido em Belfast, Irlanda, em 29 de novembro de 1898, Clive Staples Lewis (1898-1963), mais conhecido como C. S. Lewis, está na lista dos mais influentes fornecedores de argumentos cristãos apologéticos na ficção e no romance.

O objetivo de experimento é propor que a leitura literária seja uma experiência individual, no qual o leitor “letrado” seja capaz de se libertar de seu próprio mundo e perceber, por meio da relação com o texto pelo texto, a construção de outros mundos e perspectivas.

A partir dos “diferentes modos de ler”, Lewis argumenta que nem todos leem da mesma forma. Os “literariamente iletrados” (os “muitos”), em geral, nunca leem duas vezes a mesma coisa. O principal argumento deles é: “eu já li isso”. Esses, portanto, raramente dão importância à leitura. Eles “se voltam à leitura como última opção e a abandonam com entusiasmo assim que qualquer alternativa de passatempo se faça presente”.

Por outro lado, os “literariamente letrados” (os “poucos”) são aqueles que “estão sempre procurando tempo livre e silêncio para poder ler e fazê-los com toda a sua atenção”. Eles leem grandes obras dez, vinte ou trinta vezes ao longo de suas vidas. Não apenas leem as obras como obrigação de criticá-las, tornando-se escravos de um objetivo reduzido de certo trabalho a ser cumprido. Leem porque precisam delas.

Portanto, a pergunta é: “Por que lemos”? A resposta definirá a compreensão da expansão do que desejamos encontrar na arte em geral e na literatura. O caminho é olhar, escutar, receber. Tirarmos a nós mesmos do caminho. Deve haver em toda experiência de leitura uma troca de olhares entre leitor e obra. É uma relação de afeto profundo e de singeleza, por meio da qual o leitor experimenta a beleza construída no texto. Não se trata de “gostar” ou “não gostar”. Esses adjetivos não refletem com exatidão o real sentido da arte. O gosto não define qualidades.

Por trás daquela obra, pode haver algo de que eu precise. Não o precisar utilitário, mas o de contemplação. Preciso ver porque ela está lá para ser vista. Não devo apenas ler com os olhos, mas devo ouvir o que ela “tem a dizer”. Seja na música, na pintura ou na literatura, há sempre o “dito” que está lá e que deseja ser encontrado.

A obra quer falar. E apenas os leitores literariamente letrados são capazes de ouvi-la, porque não são surdos para as cacofonias, as aliterações e as elipses de um texto. Os literariamente letrados têm ouvidos atentos, olhos sensíveis, mentes e corações afetivamente dispostos para o diálogo. Eles se sentam para ver e ouvir e sabem que precisam do texto. É este o prazer do texto: revelar-se e ser achado, fulgurar e ser visto, dizer e ser ouvido.

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