Um sonho de criança que se tornou realidade: o menino que brincava de cinema no quintal de sua casa na cidade Coração de Jesus mais tarde veio construir o mais romântico dos cinemas que Montes Claros já teve

Jornal O Norte
Publicado em 30/10/2006 às 11:09.Atualizado em 15/11/2021 às 08:43.

Samuel Nunes


Repórter


samuelnunes@onorte.net



Na edição de hoje a reportagem de O Norte outra vez mais foi no fundo do baú e através até o ex-operador de projeção do cine Fátima, Benjamim Ribeiro Sobrinho, natural da cidade de Várzea da Palma e que hoje está com 74 anos e mora em Montes Claros desde os 3 anos de idade. Ele demonstra seu amor pela terra da carne de sol e do pequi ao se referir a alguns patrimônios históricos da cidade que ao decorrer dos anos vem se perdendo, ou pela vinda do progresso, ou mesmo pela falta de políticas públicas voltadas para a arte e a cultura. Ele conta que é aposentado pela rede ferroviária Central do Brasil, e sempre gosta de acompanhar tudo que envolve cultura.



- Também escrevia uma coluna no suplemento Opinião do jornal O Norte, onde eu elogiava e criticava o que via em Montes Claros - lembra.



COMO SURGIU O CINE FÁTIMA



Com precisão Benjamim Ribeiro Sobrinho afirma que vivenciou um interesse pela arte e cultura com o progresso das casas de diversão nesta década e teve a oportunidade, portanto de acompanhar de perto as construções das principais casas de cinema de Montes Claros. Com uma memória invejável ele revela que o Euller Lafetá, proprietário do cine Fátima ainda quando criança brincava de uma forma diferente das demais crianças da sua idade.





Benjamim Ribeiro Sobrinho diz que acompanhou o Cine Fátima da inauguração até o fechamento (foto: Wilson Medeiros)



- Ele brincava de cinema no quintal de sua casa na cidade de Coração de Jesus, o tempo passou e já na sua idade adulta ele se transformou em comerciante sendo que logo depois mudou se para Montes Claros – conta.



Benjamim revela que em 1958 aproximadamente aconteceu a compra de um terreno por parte de Euller Lafetá na rua D.Pedro II centro de Montes Claros. Depois disto ele foi até a cidade de Varginha, sul de Minas Gerais, e conheceu um engenheiro-arquiteto que já tinha uma planta de um cinema construído na cidade de Sete Lagoas e com este modelo o Euller Lafetá construiu o cine Fátima.



- Nesta época ele já se preocupava em construir um cinema de qualidade e à altura do que nossa cidade merecia. O Cine Fátima foi comparado com outros cinemas dos grandes centros do país. A construção foi grande e pode se dizer lenta, mas o importante é que esta obra não parou - salienta.



ESTRUTURA ADEQUADA



Sobre a estrutura do cinema Benjamim diz que a que foi usada veio de Belo Horizonte e foi a primeira que chegou a cidade.



- A estrutura usada foi de metal, a construção da sala de projeção foi feita de acordo com a aparelhagem que foi comprada. As paredes eram de granitos a jato isento de quinas vivas e arredondadas. Sobre o teto e as paredes de frente para as telas. Segundo Benjamim estas foram forradas com material acústico. Quanto ao equipamento de som e projeção ele explica que foi feito um contrato com um representante do Brasil, e que este equipamento para exibição de filmes tinha o som ótico comum e magnético estéreo de 4 canais e foi importado da Inglaterra sendo de alto valor. Segundo Benjamim esta aparelhagem era uma novidade no comércio cinematográfico e para uma pessoa para lidar com ela seria necessário treinamento para adquirir conhecimento e aptidão para o assunto. Ele conta ainda que a cortina do cinema era automática e tinha 400 metros de tecidos, 15 metros de altura e 32 de largura.



CONVITE PARA TRABALHAR



Com emoção ele conta que foi convidado por Euller Lafetá para trabalhar no cine Fátima e, inclusive, fazer um estágio na Inglaterra, mas ele não achou necessária sua ida ao continente Europeu.



- Além de eu não ter achado necessário minha ida, outro fator negativo seria minha ausência do serviço durante muitos dias - argumenta. Ele conta que as 1.400 poltronas do Cine Fátima foram adquiridas com assento automático junto à empresa Brefor. Benjamim diz com orgulho que através do seu trabalho no cinema e mesmo depois da sua extinção teve a oportunidade de assistir aproximadamente de 15 mil filmes o que para ele é uma fonte inesgotável de cultura.



- Eu trabalhei na sala de projeção até 1962 e depois passei a dar manutenção na aparelhagem - lembra. Outro ponto mencionado por ele é que enquanto os filmes não eram exibidos em algumas capitais eles não chegavam a Montes Claros. Benjamim afirma que os filmes eram passados no departamento de censura e diversões públicas, lá eles eram exibidos e depois era criada uma comissão, se existisse alguma fala que iria de encontro ao governo de modo negativo ou qualquer outra inconveniência o filme era censurado.



PORQUE CINE FÁTIMA



Outra informação importante mencionada por Benjamim é que o motivo pelo qual Euller Lafetá denominou de Cine Fátima o principal cinema de Montes Claros na época é que ele tinha uma filha por nome de Fátima e também pelo fato de ele ser devoto de Nossa Senhora de Fátima. Benjamim conta que o cinema foi inaugurado em 13 de fevereiro de 1960 e foi feito um coquetel neste dia para mais de 200 pessoas de Montes Claros e de outros centros do país como Belo Horizonte, São Paulo e Rio de janeiro.



- Neste dia foram exibidos trailers de desenhos animados, à noite aconteceu uma sessão especial com o filme Cristo de Bronze. Com saudade ele conta com orgulho que mais de 4 mil pessoas por semana freqüentavam o Cine Fátima.



- A fila para entrar no cinema subia as ruas Doutor Santos e São Francisco, era muita gente. Eu presenciei a construção do cine Fátima e hoje vejo com tristeza a sua destruição por completo - desabafa.



Questionado sobre por que isto não acontece mais na cidade ele ressalta que um dos motivos é um grande número de jovens que estudam à noite.

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