cidade

Quilombolas de MOC contestam ‘13 de Maio’

“Porque a escravidão está aí, até hoje, até agora, neste exato momento”, diz moradora

Larissa Durães
Publicado em 12/05/2023 às 19:28.
Para Mãe Vera e Pai Jair, data é apenas um marco no calendário, sem valor (Larissa Durães)

Para Mãe Vera e Pai Jair, data é apenas um marco no calendário, sem valor (Larissa Durães)

A abolição da escravatura no Brasil ocorreu no dia 13 de maio de 1888 por meio da Lei Áurea, assinada pela princesa regente Isabel. Após 135 anos da abolição, a data deveria ser de festividades, entretanto, a população negra brasileira continua a busca por seus direitos como cidadãos. Comunidade Quilombola de Montes Claros, Norte de Minas, localizada no bairro Camilo Prates, contesta a simbologia da data e falam sobre as dificuldades enfrentadas pelos negros atualmente.

Há 70 anos, o Quilombo dos Nogueiras exalta a ancestralidade dos seus antepassados na cidade. Descendente de escravizados, Vera Lucia Silva Santos, de 73 anos; conhecida na comunidade como Mãe Vera, comenta que a abolição serviu apenas para os brancos, para que eles não desempenhassem o papel de preconceituosos ou racistas. “Mas, para nós, não tem muita valia comemorar o ‘13 de Maio’. Porque a escravidão está aí, até hoje, até agora neste exato momento. Porque o negro se ficar até mais tarde nas ruas do Brasil, ele vira ladrão, assassino, bandido. Sempre tem um adjetivo pejorativo para um branco falar sobre nós, mesmo se estivermos só voltando do trabalho”, constata Mãe Vera.

Sobre os pré-conceitos que sofre a religião de matriz africana, Mãe Vera conta que ainda hoje as pessoas vão até os terreiros, de forma desordeira e preconceituosa, para quebrá-los. “Que abolição é essa?”, Mãe Vera pergunta aos “donos das Leis”. “Para mim, dia ‘13 de Maio’ é um dia simbólico, só para os brancos comemorarem, porque os pretos não conquistaram o que seria seu por direito. Queria ver hoje os negros terem a liberdade de ser o que quiserem ser, de falar o que quiserem falar, de viver o que quiserem viver, como os brancos desta nação. Mas nesse Brasil, onde a escravidão nunca terminou, isso não é possível”, completa. 

PERTENCIMENTO
Para o cabeleireiro, Jair Tomé Nogueira, o Pai Jair, que faz parte da terceira geração do quilombo dos Nogueira, o terreiro é onde ele se encontra. “Aqui, a gente vive o passado dos nossos ancestrais, mas vive o presente com amigos, com conselhos, onde a empatia sobressai, porque se tem um amigo doente, estamos aqui para ele. Se alguém está precisando de uma ajuda espiritual, estamos aqui para confortar essa pessoa. Aqui os orixás vêm nos abraçar e nos aconselhar”, relata.

E, apesar dessa ancestralidade, Pai Jair conta que os olhares montes-clarenses ainda são de julgamentos. “Aceitamos críticas, tanto positivas quanto negativas, porque estamos aqui para melhorar. Mas não pode ser com pré-conceitos formados contra algo que elas desconhecem. Estamos aqui de portas abertas, podem vir para nos conhecer e entender. Não somente quando precisam. Porque aí, quando precisam elas vêm. Depois que conseguem o que querem, voltam a nos olhar com ar de indiferença e julgamentos”, conta.

Para a pensionista Joana Aparecida Nogueira Silva, o “13 de Maio” nada mais é que um dia qualquer. “O Brasil nos deve. As pessoas devem entender que o que hoje é mais voltado para os negros, descendentes dos escravizados, é somente uma reparação, exatamente, porque nos deram a tal abolição, mas não nos indenizaram pelo sofrimento e encarceramento forçado lá atrás. Nos libertaram só no papel: de fato e no ato, nunca!” afirma. 

Compartilhar
Logotipo O NorteLogotipo O Norte
E-MAIL:jornalismo@onorte.net
ENDEREÇO:Rua Justino CâmaraCentro - Montes Claros - MGCEP: 39400-010
O Norte© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por