População ‘expulsa’ da Praça de Esportes

Sequência de decisões sem consultar a população causa revolta em Montes Claros

Manoel Freitas e Carlos Castro Jr.
O Norte - Montes Claros
24/08/2018 às 05:52.
Atualizado em 10/11/2021 às 02:04
 (MANOEL FREITAS)

(MANOEL FREITAS)

A Prefeitura de Montes Claros abriu nesta semana os envelopes da licitação para construir um muro no entorno da Praça de Esportes, um dos maiores patrimônios do município.

Pela intensa arbori-zação, a área é conhecida como o “pulmão” da cidade. A muralha terá extensão de pelo menos 400 metros e o valor orçado é de quase R$ 300 mil. Os documentos estão em análise e o vencedor deve ser divulgado nos próximos dias.

A decisão da Prefeitura revoltou a população, que cobra a revitalização do espaço para que ele possa ser utilizado, não que seja erguido mais um instrumento de exclusão.

Sem manutenção adequada, a praça está fechada à comunidade há bastante tempo. Antes utilizado para realização de projetos sociais e esportivos, o local está deteriorado. As quadras estão destruídas, entulho espalhado, principalmente ao lado das piscinas e do campo de futebol. 

A licitação ocorre sete meses após o prefeito Humberto Souto anunciar que realizaria o processo para construção da muralha na área verde, mas com a promessa de viabilizar uma autarquia para cuidar do complexo esportivo. 

As piscinas, com poucas atividades, de acordo com a fala do chefe do Executivo, também teriam emenda destinando recursos para a modernização, ao mesmo tempo em que seria construído, de acordo com a entrevista em 2 de fevereiro de 2018, um ginásio poliesportivo, que não saiu do papel. 

Em julho de 2017, a reportagem de O NORTE flagrou no local jovens entre 10 e 16 anos nadando em uma das piscinas de até cinco metros de profundidade. Naquela época, a praça estava sem porteiros e sem seguranças. Para coibir as invasões, a decisão da Prefeitura foi a construção da muralha.

A arquiteta e urbanista Helloíne Francielle acredita que no local podem ser realizadas várias ações de segurança sem perder a arborização. “A pessoa que pula grade também pula muro. Ali, um reforço na grade, mais uma proteção em cima, como concertina, resolveria o problema de maneira simples”, disse.
 
IGNORADA
Para tomar a decisão, o Executivo não precisaria discutir a obra na Câmara de Montes Claros, mas segundo o vereador Valcir da Ademoc, pelo menos a população que vive no entorno da praça deveria ter sido consultada.

O parlamentar disse ainda que o muro não resolve o problema da segurança. “O que nós precisamos é de vigias e de outras ferramentas para que realmente tenha segurança”, avalia.

Na avaliação de moradores e esportistas, o que o local precisa é de ser ocupado, é de pessoas utilizando a estrutura para valorização do esporte e resgate de crianças e jovens socialmente vulneráveis.

O jornalista Heberth Halley, ex-atleta do Montes Claros Tênis Clube, mobilizou a população montes-clarense em fevereiro deste ano para dar um abraço simbólico na praça. Ele questiona a falta de utilização do espaço, que foi construído para práticas esportivas. “O que hoje não tem lá são atletas. Nós lutamos para que lá tenha a prática esportiva”, ressalta.

A reportagem solicitou resposta da Prefeitura de Montes Claros, mas até o fechamento desta edição, não obteve retorno. Tentamos contato também com o secretário de Esportes, mas ele não atendeu às ligações.

Praça deixa saudade em atletas do passado
“Murar a praça de Esportes é acabar com Montes Claros”. A fala emocionada e indignada é de Manoel Costa Damasceno, de 74 anos, o Manoelito, um dos atletas de futebol de maior renome que atuou na cidade.

Antes de mudar para Montes Claros, em 1952, Manoelito jogou no Santos, Bahia e no Atlético Mineiro. “A Prefeitura nunca poderia fazer uma coisa dessas, seria terrível para todos nós, porque a praça é sinônimo de verde, de movimento”, diz.

O abandono e cercamento da praça de Esportes também é um desrespeito à cidade e à população na avaliação de quem teve a formação esportiva naquele espaço, caso do ex-goleiro do San Remo Esporte Clube, o serralheiro João Carlos Pereira, de 59 anos. Ele morou durante 54 anos na avenida Artur Bernardes, onde fica a entrada para o complexo esportivo. “Ali eu fui criado, fiz futebol e natação”, lembra.

“Vou ser sincero com você, não acho certo murar a praça de Esportes. Eles deveriam colocar uma tela ecológica igual a que a Unimontes está colocando. Todo mundo tem que ver o clube”, diz, revoltado com a decisão do município.

O sonho do ex-goleiro é que a praça “volte a ser o que era antes, com as piscinas cheias, os atletas participando e, aos sábados e domingos, cheio de gente”.
 
POLÊMICAS
As várias decisões sobre o destino da praça e a indefinição causam insegurança na população. Em fevereiro, a Prefeitura anunciou que transformaria parte da área em estacionamento, cobrando pelo uso das vagas. O decreto chegou a ser publicado no Diário Oficial do Município. A medida gerou críticas de vários setores da sociedade.

O advogado Farley Menezes, especialista em direito público, avaliou que “o local funciona como centro esportivo. O uso em outra função modifica a sua natureza”.

No mesmo mês, O NORTE denunciou que os banheiros públicos da praça haviam sido fechados no começo da atual gestão municipal e que a decisão causava constrangimento para quem precisava utilizá-lo. 

Em março, desportistas da cidade se uniram para cobrar a revitalização do espaço durante audiência pública na Câmara. Profissionais da área temiam pelo futuro do esporte na cidade. Uma das denúncias era de que os programas esportivos que aconteciam no local foram desativados em 2017.

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