Norte de Minas é, mais uma vez, palco de trabalho escravo

Seis trabalhadores foram resgatados em Lassance nesta quinta-feira

Da Redação*
30/04/2022 às 00:14.
Atualizado em 30/04/2022 às 10:16
Trabalhadores estavam em alojamentos em estado precário e sem banheiro (ministério do trabalho/divulgação)

Trabalhadores estavam em alojamentos em estado precário e sem banheiro (ministério do trabalho/divulgação)

O Norte de Minas é, mais uma vez neste mês, palco de resgate de trabalhadores em condições análogas à escravidão. Nesta quinta-feira (28), seis trabalhadores foram retirados da situação em uma empresa de produção de carvão vegetal após extração de eucalipto em Lassance. O grupo foi encontrado por auditores fiscais do Ministério do Trabalho (MT).

Minas Gerais é responsável por 25% das denúncias desse tipo de crime. Dados divulgados pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) no início de abril deste ano apontam que 31 empresas mantiveram trabalhadores nessa situação no Estado. No site do Observatório do Trabalho Escravo, Montes Claros aparece com seis denúncias.

Na fiscalização desta semana, em Lassance, os fiscais constataram que nove pessoas trabalhavam informalmente e seis estavam submetidas a condições degradantes. De acordo com nota enviada pelo órgão, não havia instalação sanitária nas frentes de trabalho. Os alojamentos apresentavam precário estado de conservação, higiene, segurança e conforto e não havia distribuição de equipamentos de proteção (EPI) para realizar as atividades laborais.

Nem a água, de acordo com o Ministério do Trabalho, estava adequada para consumo e preparo dos alimentos. Após a ação dos auditores, o empregador fez o pagamento de verbas rescisórias e salários atrasados no valor total de R$ 39.040,91. Ficou acordado também o pagamento de R$ 8.300 por danos morais, valor que será dividido pelos trabalhadores resgatados.

A operação foi realizada pelo Grupo Especial de Fiscalização Móvel (GEFM) do Ministério do Trabalho e contou com participação do Ministério Público do Trabalho, Defensoria Pública, Polícia Rodoviária Federal, Polícia Federal e Ministério Público Federal.
 
OLHOS D’ÁGUA
Também em abril, trabalhadores de uma fazenda em Olhos D’Água foram resgatados em uma ação coordenada pelo Ministério Público do Trabalho, depois de uma denúncia que chegou ao órgão. O empregador mantinha trabalhadores para o corte de eucalipto e produção de carvão. Em ambas as situações, o MPT encontrou situações de irregularidade, que foram caracterizadas como trabalho escravo contemporâneo.

Procuradora do Ministério Público do Trabalho designada para a ação, Sara Bonaccorsi informou que os 24 trabalhadores foram encontrados em situação bastante ruim. A empresa não fornecia alojamentos adequados. Não havia cama, colchão, lençol individual nem banheiro. 

“Eles faziam suas necessidades fisiológicas no mato. Tanto na área de corte de eucalipto quanto dos fornos de carvão ou no próprio alojamento. Não tinham banheiro ou eram insuficientes ou estavam inadequados, sem água na pia, descarga não funcionava e a água destes trabalhadores era coletada em um riacho local também utilizado para os animais. A empresa não apresentou nenhum tipo de comprovação de potabilidade dessa água”, relata a procuradora.

Além da deficiência do espaço, Sara informou que a prestação de serviço estava fora dos padrões, sem definição de jornada de trabalho, sem treinamento e sem (EPI).
 
PENALIDADES
A partir da situação, a empresa entra na Lista Suja do Trabalho Escravo e é acionada por medida judicial, tendo que rescindir os contratos de trabalho e pagar as verbas rescisórias. O trabalhador terá o direito a três parcelas de seguro desemprego, independentemente de contribuição.

Além disso, o MPT cobra o dano moral individual, destinado aos trabalhadores, o dano moral coletivo, destinado à sociedade, e a empresa se compromete a não repetir a situação e proteger os trabalhadores futuros e atuais, com a correção das medidas nesta e outras empresas.

Estado lidera ações em 2021
Minas Gerais teve 768 trabalhadores resgatados em condições análogas à escravidão em 2021, segundo números da Subsecretaria de Inspeção do Trabalho (SIT). O Estado foi o que mais fez esse tipo de resgate no Brasil, com pouco mais de 20% das ações executadas e 40% do total de trabalhadores resgatados no país. Em média, 14 pessoas foram retiradas da condição a cada semana em Minas no ano passado.

As atividades econômicas em que mais aconteceram casos foram o cultivo de café, cultivo de alho e produção de carvão vegetal.

De acordo com o SIT, o perfil dos trabalhadores resgatados, em sua maioria, consiste em homens pardos ou negros, entre 30 e 39 anos, de origem ou residência no Nordeste do país e sem ensino fundamental completo.

“A portaria em vigência aponta para quatro condições que caracterizam o trabalho análogo à escravidão: condição degradante; servidão em decorrência de dívida; jornada exaustiva e impedimento do direito de ir e vir”, explica Ivone Corgozinho, presidente da Delegacia Sindical de Minas do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais do Trabalho (Sinait).

Segundo ela, a ocorrência de ao menos uma dessas características já indica condição análoga à escravidão, e deve ser denunciada o quanto antes. “Atualmente, nós temos o Ministério Público do Trabalho e o Sistema Ipê como grandes canais de denúncia. Mesmo com os riscos, não podemos deixar de coibir essa prática”, completa.

*Com Márcia Vieira

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