Dentro de casa e até na web: cresce violência contra a mulher

Vida íntima exposta nas redes sociais tem causado grandes estragos

Christine Antonini
10/08/2019 às 07:45.
Atualizado em 05/09/2021 às 19:56
 (ARQUIVO PESSOAL)

(ARQUIVO PESSOAL)

Na semana em que a Lei Maria da Penha completa 13 anos, entidades e órgãos de segurança pública chamam a atenção para a necessidade do firme combate à violência doméstica. Somente neste ano, em Montes Claros, foram expedidas, em média, 51 medidas protetivas por mês, em um cenário onde 1.446 mulheres foram vítimas da violência – número 5% maior que os 1.383 registros do mesmo período de 2018.

Além da agressão física, uma que tem chamado a atenção das autoridades e gerado muita preocupação é a violência on-line. Nessa situação, mulheres têm a vida íntima exposta em redes sociais, geralmente após o término de algum relacionamento. 

O último relatório da Comissão Permanente Mista de Combate à Violência contra a Mulher, do Senado Federal, mostra casos desse tipo que repercutiram na mídia, de 2015 a 2017 – 500 meninas (menores de idade) foram expostas por vingança, mil crimes contra a honra e 127 suicídios de mulheres por terem as imagens íntimas compartilhadas na internet.

A Polícia Civil de Montes Claros não tem dados sobre violência contra a mulher on-line, que trata sobre a divulgação ou ameaça de compartilhamento de vídeos/fotos íntimas. Também é considerado crime quando existe ofensa – o chamado cyberbullying.
 
CHANTAGEM
A Defensoria da Mulher aponta que casos como estes têm sido frequentes envolvendo meninas de 14 a 17 anos. “É comum a gente receber, na Defensoria, casos de menores de idade que enviaram ou deixaram os namorados as fotografarem nuas, o que chamamos de ‘nudes’, e depois que terminam o relacionamento os parceiros divulgam essas imagens. Ainda temos situações em que a menina é estuprada e o agressor filma toda a ação para utilizar como forma de chantagem para que não haja a denúncia”, pontua a defensora da Mulher, Maísa Rodrigues.

Para Bruna (nome fictício), o primeiro amor não foi o conto de fadas representado em filmes e novelas. Ainda no ensino médio, aos 16 anos, Bruna se apaixonou por um garoto da escola. Após algumas conversas pela internet, o menino divulgou o conteúdo para toda a escola. Segundo a estudante, o conteúdo era muito íntimo e causou extremo constrangimento. 

“Além dos meus amigos, minha família ficou sabendo e foi tudo muito turbulento. Minha família, na época, não reagiu bem. Até entendo a situação deles, que não sabiam lidar com a reação das pessoas sobre o assunto e a respeito do que falavam de mim. Era algo que me causava fragilidade, pois era muito íntimo”, conta Bruna. 

A defensora Maísa Rodrigues explica que a violência on-line contra a mulher é praticada para desqualificar, humilhar e expor a vítima. De acordo com ela, nessas situações, a sociedade julga a mulher, enquanto o homem é poupado. 

“A vítima acaba sendo considerada pela sociedade como responsável pelo ato, enquanto o homem que divulga o conteúdo é poupado. No mundo onde vivemos sempre a mulher vai ser culpada, a responsável por ter mandado a foto nua. Precisamos parar de responsabilizar a vítima, parar de revitimizar essa mulher. Temos que unir forças e ajudar a levar esse agressor à Justiça, para que ele responda por isso”, afirma a defensora.

Pena de 3 anos de prisão
O compartilhamento de pornografia sem o consentimento dos envolvidos é considerado crime. A lei de 2012 contra esse tipo de ato leva o nome da atriz Carolina Dieckmann, que teve fotos nuas e conversas íntimas divulgadas na internet sem autorização. O autor das publicações pode pegar de oito meses a três anos de prisão. 

“Existem duas formas de crime da comunicação digital: pornografia da vingança e o cyberbullying – ambos são utilizados para ferir a imagem da mulher. Existem diversos grupos que possuem somente essa finalidade”, afirma a defensora da Mulher, Maísa Rodrigues.

Um dos casos recentes entre os famosos, que chamou a atenção, envolveu a atriz Paolla Oliveira. Atuando na novela das 21h da TV Globo como a digital influencer Vivi Guedes, a atriz teve supostas imagens íntimas divulgadas nas redes sociais no último mês.

Informações divulgadas pelo advogado da estrela afirmavam que se tratava de uma atriz pornô americana considerada sósia da brasileira. Mas até que tudo isso fosse explicado, o vídeo foi compartilhado por milhares de pessoas.

FILHAS DE FRIDA
Em Montes Claros, o grupo Filhas de Frida foi criado há quase quatro anos pela estudante do curso de Ciências Sociais Eduarda Rodrigues de Almeida Porcino para encampar a luta pelos direitos das mulheres.

Tem mais de 493 mil seguidores de vários países no Instagram. O movimento também leva o debate para escolas públicas e privadas e faculdades, sempre ressaltando a importância da denúncia em qualquer ato de assédio ou abuso.

“Prego para todas que acompanham o perfil que é para cada uma leve em consideração a consciência tranquila e não com a reputação que a sociedade prega. Nada vai estar bom para todo mundo, e se formos viver pensando no que as outras pessoas pensam de nós, a gente não vive”, pondera Eduarda. 

Na Câmara Federal, o Filhas de Frida ganhou a maior comenda da Casa – o prêmio Neide Castanha –, oferecida às entidades que ajudam a combater o abuso sexual. 

“Por sermos mulher, as coisas vão cair sobre a gente de maneira muito mais pesada em relação aos homens. O machismo predomina na forma como temos que nos comportar ou falar e como responderemos nas nossas ações”, afirma a estudante. 

SAIBA MAIS
Veja quais os tipos de violência contra a mulher

Provavelmente quando você ouve essa frase passa pela cabeça que violência contra a mulher é um tapa, um soco, chute, ou seja, uma agressão física. Mas a violência vai muito além disso: várias mulheres sofrem todos os dias algum tipo de agressão e nem mesmo se dão conta. Confira os tipos de violência e saiba como denunciar:

- Psicológica: qualquer conduta que cause à mulher dano emocional e diminuição da autoestima, como ofensas e ameaças. 

- Sexual: qualquer ação que obrigue a mulher a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força. Além dos estupros, também é considerado violência sexual: obrigar a mulher a realizar algum tipo de ato durante a relação, impedir o uso de métodos contraceptivos ou forçar o aborto. 

- Patrimonial: ação ou conduta que possa configurar retenção, subtração, destruição parcial ou total dos objetos da mulher. Esses bens podem ser instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer as necessidades da mulher. DENÚNCIAA denúncia pode ser feita pelo Disk 180 (Canal da Mulher) ou direto na Polícia Militar, pelo 190. Qualquer pessoa pode fazer a denúncia, não precisa ser necessariamente a vítima. 

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