(FOTOS MANOEL FREITAS)
O povo Xakriabá, maior grupo étnico do Estado, segue uma máxima. O lema diz que índio tem que ter um pé na aldeia e outro no mundo, numa alusão à necessidade de adquirir conhecimento para se qualificar e também preservar tradições, fortalecendo o sentimento de pertencimento ao grupo. No ano passado, essa união entre sabedoria ancestral e academia se fortaleceu e render ainda mais frutos a partir de agora. Quem saiu do “ninho” para estudar volta para casa a fim de compartilhar e multiplicar os saberes.
O ano de 2019 entrou para a história dos Xakriabás. Pela primeira vez, a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) realizou, em território indígena, Seminário de apresentação dos Trabalhos de Conclusão do Curso (TCC) de Formação Intercultural para Educadores Indígenas, com habilitação em Ciências da Vida e da Natureza – engloba física, química e biologia.
Na Aldeia Sumaré, 15 indígenas concluíram a formação e agora estão aptos a atuar como professores nos anos finais dos ensinos fundamental e médio, nas áreas de Línguas, Artes e Literatura, Matemática, Ciências da Vida e da Natureza e Ciências Sociais e Humanidades.
A graduação foi realizada nas próprias aldeias, de modo a valorizar a diversidade, a experiência sociocultural e suas particularidades.
“É motivo de grande orgulho, hora de parabenizar os professores e os mais velhos, que batalharam, lutaram para que pudéssemos ter nossa escola indígena”, ressalta o cacique Domingos Nunes.
HISTÓRIA DE LUTAS
O secretário de Cultura Hilário Dbazakzêkõ, da Aldeia Barreiro Preto, salientou que desde o início o curso foi construído em conjunto pela UFMG e lideranças indígenas, com apoio do Conselho Consultivo de Lideranças Indígenas, instituído em 2013. “Valorizar ainda mais a natureza tem tudo a ver com o nosso povo, parceiros na defesa do território, porque muitos desafios vêm pela frente”.
A filha dele, Célia Xakriabá, uma das ativistas de direitos humanos mais respeitadas no Brasil atualmente, disse em tom emotivo: “Quando eu saio (da aldeia) e me perguntam onde estudei, digo que meus primeiros professores foram as lideranças, pessoas que não tiveram o privilégio de ter o “L” de ler, mas sempre tiveram o “L” de luta”.
Ele sabe bem a importância de integrar conhecimentos. “Desde cedo ouço dos mais velhos: ‘do lado de lá vocês podem até adquirir inteligência, mas é do lado de cá que adquirem sabedoria’. É uma verdade, porque estar na universidade é uma ferramenta de luta, pois o papel guarda parte da oralidade, mas não guarda o conhecimento. Aprendemos mais com árvore viva do que com papel morto, porque temos os pés firmes no território, escrevemos coletivamente”.