Jerúsia Arruda
Repórter
jerusia@onorte.net
Ele veio da cidade de Alto Santo, Ceará. Na bagagem, a seca, a poesia que a dor da saudade inspira, e a ebulição provocada pelos doze anos de luta pela sobrevivência na grande São Paulo.
Com letras críticas e engajadas, o cantor cearense Sérgio Oliver lança seu primeiro CD (foto: divulgação)
Com jeito tranqüilo, expressão alegre de quem não se deixa abater pela pressão cotidiana, palavras firmes e humor quase ferino, Sérgio Oliver é o típico representante de um povo que não tem medo da vida, que abre as asas para altos vôos e sonha ganhar o mundo.
Vivendo em Montes Claros desde 1996, chegou por essas bandas mascateando roupas, histórias, sonhos e o desejo de se firmar como cantor, primeira profissão, que abraçou desde os oito anos de idade.
Filho de sanfoneiro, de quem herdou o gosto pela música, Sérgio conta que, incentivado pelo pai, mudou-se bem cedo para São Paulo. No ano de 1994, gravou seu primeiro LP – Ondas do tempo - pela Hermison Discos.
Com o plano Collor, a gravadora que teve seu dinheiro retido, dispensou todos os artistas que representava e, então, Sérgio foi obrigado a ganhar a vida de uma outra maneira. Começou a vender roupas. Ficou mais dois anos em São Paulo até que decidiu viajar Brasil afora, buscando um lugar que pudesse abrigar sua arte. E foi assim que, cheio de sonhos, chegou a Montes Claros.
- Quando saí de São Paulo estava muito desgostoso. Havia apostado no meu disco e não deu certo. Quando aqui cheguei, logo me senti em casa. As pessoas são solidárias, esperançosas, estudiosas, trabalhadoras. Acolheram-me bem – relembra o cantor, que diz ter percebido logo no início que a região lhe criaria oportunidade para retomar seu trabalho artístico.
INSPIRAÇÃO
Apesar de continuar trabalhando com confecção, Sérgio diz não ter desistido.
- A riqueza da cultura norte-mineira me inspirou e refletiu amplamente em meu trabalho. Aqui pude fazer o que considero minhas melhores composições – explica o cantor, que participou de festivais como Canta Minas, em Montes Claros, e em vários eventos em outras cidades da região.
Depois de anos compondo, mas sem muita coragem para retomar definitivamente as rédeas de sua carreira como cantor, por insistência do pai, Sérgio grava seu primeiro CD, com o título Forró do mensalão.
Crítico e com um engajamento social típico de quem já viu de perto o sofrimento, o disco traz canções de protesto contra a corrupção política e a ditadura capitalista a que, segundo ele, o povo brasileiro vem sendo submetido.
- Qualquer brasileiro pode desenvolver o senso crítico porque todos são vítimas do sistema. É só olhar ao seu redor. O povo brasileiro não tem uma preparação nas bases, na escola, que lhe conscientize da importância de participar da vida pública. Por causa disso votamos errado, favorecendo a corrupção. Não sou apenas cantor. Sou também cidadão e através da música quero expressar minha indignação. Não vou me calar. Se eu posso despertar a atenção das pessoas para o problema, vou fazer isso. As pessoas precisam entender que a voz mais forte do país tem que ser do povo. Os políticos, principalmente – desabafa.
MONTES CLAROS
Observador inquieto, Sérgio diz que a vontade de crescer, de se estabelecer, do artista montes-clarense lhe deu ânimo para retomar a caminhada pela música.
- Aprendi a admirar o artista de Montes Claros. Aqui tem grandes músicos e poetas, e muita gente nem percebe. Tem muito jovem talentoso que não tem espaço para mostrar seu trabalho. Pude perceber que aqui falta incentivo da administração pública, faltam eventos populares, falta o apoio para que o artista se estabeleça. As lideranças ainda não perceberam que a cidade cresceu e é preciso fazer um trabalho que atenda a demanda. Pessoalmente, consegui retomar minha carreira aqui porque vi o esforço que esses artistas fazem, sozinhos, sem ajuda e quase sem retorno. Isso me incentivou muito – avalia.
DE VOLTA
Apesar de achar que o forró em Minas Gerais tenha ganhado um espaço importante - inclusive sugerindo que Montes Claros tenha um evento exclusivo de forró, que ele mesmo batiza de Forromontes-, já com o CD pronto, Sérgio retornará à cidade de São Paulo - onde vai batalhar por uma distribuidora e, quiçá, uma gravadora que possa representá-lo.