Por trás do céu de fitas

Pesquisa revela impacto das Festas de Agosto em Montes Claros

Larissa Durães
larissa.duraes@funorte.edu.br
Publicado em 05/08/2025 às 19:00.
Núbia Istela Lima Santos investiga as Festas de Agosto em Montes Claros, focando na economia simbólica e criativa (Léo Queiroz)
Núbia Istela Lima Santos investiga as Festas de Agosto em Montes Claros, focando na economia simbólica e criativa (Léo Queiroz)

A tradicional Festa de Agosto de Montes Claros, além da riqueza cultural, movimenta a economia local. Essa é a conclusão da pesquisa “Por trás do céu de fitas”, da jornalista Núbia Istela Lima Santos, que será apresentada em 11 de agosto, às 17h, no Museu Regional, junto ao lançamento do livro e do documentário homônimos.

Para Núbia, a Festa de Agosto vai além do campo religioso ou folclórico. “Ela movimenta a economia local a partir da chamada economia criativa, que é todo o capital gerado através do intelecto da pessoa, seja em livros, arte visual, gastronomia, arquitetura ou festivais”, explica. Segundo a pesquisadora, a celebração representa um dos maiores símbolos culturais de Montes Claros e uma força econômica relevante, especialmente para os setores formal e informal da cidade.

A pesquisa revela que, além de fomentar o comércio de tecidos, aviamentos, alimentação e hospedagem, a festa envolve uma economia simbólica enraizada no afeto, na história e na identidade coletiva da população. “É um valor que não pode ser medido em dinheiro, porque está atrelado ao próprio crescimento de Montes Claros há quase dois séculos”, afirma.

Apesar disso, Núbia aponta a precariedade do apoio público aos grupos tradicionais. “As festas são sustentadas majoritariamente pela solidariedade da comunidade e pelos próprios mestres”, diz. Um exemplo é o mestre Guga, que fabrica instrumentos com materiais recicláveis e investe do próprio salário nos trajes e adereços dos marujos. “Ele junta tampinhas de garrafa no bar perto de casa para fazer os pandeiros”, relata.

A realidade se repete entre outros mestres entrevistados, que mencionam dívidas recorrentes e a falta de políticas públicas permanentes. “Todos disseram que os recursos nunca são suficientes. Muitos começam o ano já devendo a festa seguinte”, observa Núbia. A demanda por mais apoio institucional é unânime entre os integrantes dos grupos culturais.

A pesquisadora também chama a atenção para o impacto econômico indireto da festa, especialmente no turismo e no comércio. “O céu de fitas é um símbolo que atrai visitantes e movimenta hotéis, bares, ambulantes e artesãos”, diz a autora. Para ela, valorizar essa tradição pode contribuir para reduzir desigualdades e dar visibilidade à história da população negra da cidade. “As festas nasceram nos porões da escravidão norte-mineira. São espaços onde os descendentes de pessoas pretas podem resgatar a própria história”, afirma.

Núbia defende que a cultura popular seja reconhecida como estratégia de desenvolvimento. “Falta conhecimento. O poder público e a população ainda não entenderam o potencial das Festas de Agosto como patrimônio e como motor da economia local”, alerta. Ela cita o exemplo de Salinas, onde, durante o Festival Mundial da Cachaça, toda a cidade se mobiliza. “Em Montes Claros, isso também deveria acontecer. Hoje, a festa ainda se limita a algumas ruas e praças”, lamenta.

O professor Roney Sindeaux, coordenador do mestrado em Desenvolvimento Econômico da Unimontes, reforça os dados levantados por Núbia. “As Festas de Agosto movimentam diferentes setores. Na fase preparatória, há um aumento na procura por tecidos e materiais para trajes. Durante o evento, o impacto é sentido na rede hoteleira, bares, restaurantes, transportes e turismo em geral”, explica.

Embora faltem dados locais específicos, Sindeaux cita estimativas da Fundação João Pinheiro, segundo as quais cada real investido em turismo gera R$ 2,70 na economia. “Isso mostra o potencial multiplicador das atividades culturais e turísticas”, afirma.

Para o professor, ainda que existam algumas iniciativas públicas, como emendas parlamentares pontuais e apoio a oficinas e materiais, falta uma política direcionada ao apoio econômico direto dos dançantes. “Muitos precisam se afastar do trabalho para se dedicar à preparação e à execução das festas”, aponta.

Ele conclui que a economia criativa, à qual as Festas de Agosto pertencem, é uma alternativa concreta para o desenvolvimento sustentável. “Essa economia dá visibilidade a grupos historicamente marginalizados, movimenta setores informais e fortalece a identidade local. É uma força simbólica e econômica poderosa que precisa ser valorizada e incentivada”, finaliza.

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