Um olhar sobre as Festas de Agosto - O músico, compositor e catopê Luis Ricardo faz uma análise das tradicionais Festas e conta como estas influenciam seu trabalho

Jornal O Norte
Publicado em 22/08/2011 às 18:45.Atualizado em 15/11/2021 às 06:03.

ADRIANA QUEIROZ


Repórter



O montes-clarense Luis Ricardo Silva Queiroz, 36 anos, reside hoje na Paraíba. Vem a Montes Claros todos os anos nesta época para participar das Festas de Agosto.



Divulgação


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Mas para isso foi preciso abrir mão de muitas coisas. Viajar, viajar bastante para dar aulas e cursos, sempre firme, acreditando que a música é uma área em ascensão, mas que precisa cada vez mais de profissionais devidamente capacitados.



De Montes Claros para a Paraíba, espaço que o doutor em Música, encontrou para construir, projetar, descobrir. Casado, pai da Luiza, em homenagem a Luisa de Tom Jobim, o montes-clarense Luis espera um mundo melhor para a pequena que nasceu na Paraíba de Zé Ramalho e Chico César.



Para ele, o importante para quem faz ou estuda música é a possibilidade de fazer uma carreira abrangendo diferentes aspectos. Luis tem conseguido atuar como violonista, ter uma prática de música efetiva, formar pessoas na área, contribuir para ter mais músicos. E sonha em realizar um trabalho em âmbito nacional e internacional, para formar pessoas de diferentes contextos, raças, classes sociais, trabalhando com a música dessas pessoas



Em Montes Claros, o ponto de referência de Luis é o bairro Santa Rita, perto da sede dos catopês, de Mestre Zanza.



Luis é filho de Luis Gonçalves de Queiroz, que trabalhou como relações públicas numa retífica, e da professora Petronília. Sua relação com a música começou muito cedo, ainda adolescente, aos oito anos de idade.



- Antes minha relação com música era igual a de todo mundo. O rock dos anos 80, me lembro muito do sucesso do RPM, Legião Urbana, Menudo, A-Ha. Eles foram os primeiros grupos de referência para mim. Eu diria desse padrão, na mídia. Via e admirava os catopês, mas não entendia muito - diz



Foi nessa época que Luis foi estudar violão no conservatório estadual de Música Lorenzo Fernandez (Celf), fez a prova, foi reprovado. Mas o menino não desistiu. Tornou tentar, foi aprovado.



Para ele, o Celf foi marcante em sua vida profissional.



- Entendi que para ser um músico profissional era necessário aliar o prazer – estas coisas todas que eu procurava na música, com a sistemática de estudo, de formação. Foi uma grande contribuição - avalia.



No violão, aprendeu muito com os professores Tião Andrade e Marcelo Drumond. Com isso, além de estudar no Celf, acabou lecionando o instrumento. Nesse tempo precisou parar, já que optou em tocar com uma banda na noite, período em retornou para estudar violão clássico. A partir daí não parou mais até se formar.



Em seguida se formou em Educação Artística/Habilitação em Música.



Aos 22 anos foi para o Rio de Janeiro fazer Mestrado no Conservatório Brasileiro de Música.



- Fiz Mestrado em Educação Musical. Foi a primeira ver que parti para uma formação abrangente, fui discutir um pouco mais o que era ser um professor de música. Nesse meio tempo, fui professor do Celf e da Unimontes - conta.



Era então o professor mais jovem da universidade, com apenas 22 anos. Apesar das dificuldades, Luis recebeu muito incentivo e toda semana ia ao Rio de Janeiro.



- Recebi apoio, afinal era importante para as instituições daqui ter um professor com mestrado – ressalta.



No Rio, conheceu a pianista, a montes-clarense Thalita Peres que já residia lá.



- Fiz uma disciplina com ela na Unimontes, e aí, eu, um jovem estudante, recebi muito apoio dela, que me ofereceu hospedagem. Fiquei um período lá. Ela é minha segunda mãe. A amizade só fortaleceu - diz.



Luís então acabou se mudando para o Rio de Janeiro, afinal era o grande pólo da música nacional. Além de aprender muito no mestrado, aproveitava para assistir grandes instrumentistas, fazendo contatos, cursos específicos.






Projeção, formação e conhecimento técnico



Tinha um violonista do exterior se apresentando, e aí Luis aproveitava para fazer o curso.



Em 1998, criou em Montes Claros, com os músicos Cuca e Jean Jobert, o grupo instrumental Trem Brasil. Ele no violão, Cuca na flauta e sax, e o Jean no contrabaixo. O grupo se apresentou em várias cidades, gravaram dois discos.



Em 2002, Luís passou no doutorado na universidade federal da Bahia (UFBA), e foi morar lá, sem perder o vínculo com a Unimontes. Mas se desligou do Celf.



Em 2004 pediu demissão e fez o concurso para universidade federal da Paraíba, para professor de música, passou e foi morar em João Pessoa.



A motivação?  É que a Paraíba tem uma das maiores escolas de música do país, cerca de 80 professores, e oferece todos os instrumentos.



- A universidade tinha pós-graduação, mestrado, e eu tinha interesse em trabalhar com a pós-graduação. Um lugar consolidado e eu via muitas perspectivas de crescimento. Estou lá desde 2004, sou professor do quadro permanente e atualmente coordenador do curso de mestrado.



Pergunto se a Paraíba é lugar de mulher brava. Ele, sorridente, diz que sim.






Festas de Agosto



Luis sempre vem a Montes Claros nesta época, e isso faz mais de 11 anos, quando faz questão de participar das Festas de Agosto, afinal fez o doutorado sobre as festividades. Pergunto para ele se algo mudou.



- Há sete anos terminei o doutorado. Para mim, tem uma transformação natural dos grupos, um confronto entre permanência e mudança. A gente tem uma ala que está aí desde que entrei, têm os integrantes mais velhos, outros com 30 anos e uma ala que está sempre mudando. Essa infanto-juvenil, que é natural. Tem os novos, mas tem sempre quem segura.



Em relação à dimensão política, sem nenhum ponto de vista idealista, sinto que a cidade podia fazer mais pelos grupos, não pela festa, considerando o aproveitamento cultural, social e turístico que a cidade tem do trabalho deles, o festejo deles. Então a cidade hoje se beneficia mais do que contribui. E faz uso disso, criou uma relação de espetacularização muito forte. Podia haver uma contribuição maior. Têm os problemas básicos, ontem, o terno de São Benedito quase não sai por causa do ônibus que não chegou - conta.



Com relação ao trabalho da imprensa durante o desfile ele acha que é de grande importância, positivo, motivacional ter a foto no jornal, mas sente uma grande invasão de alguns fotógrafos, que não respeitam esse universo.



- Deveriam conhecer mais o trabalho, ser menos invasivos com as pessoas.



Às vezes no levantamento do mastro, atrapalham toda uma estrutura - avalia.






Na hora de ouvir e ler



Luís ouve quase de tudo. Mas não se agrada daquelas de música de cunho comercial como, por exemplo, forró eletrônico, axé, música sertaneja dessa vertente atual.



- Tenho um respeito por todos os tipos de música. Gosto de música instrumental brasileira. Citaria Egberto Gismonti, o Guinga, que é um compositor carioca que tem ganhado projeção e que tem um trabalho de música instrumental muito significativo. De um modo geral, a música brasileira, João Bosco, Toquinho, Tom Jobim, Edu Lobo - destaca.



Na leitura, está sempre antenado no ponto de vista acadêmico, mas também ensaios como a cegueira de Saramago.



- É uma obra excepcional, acabou se  transformando em filme. Mas meu grande foco é uma literatura científica relacionada com música – completa.






Na intimidade



A falta de respeito à pessoa humana o tira do sério. Para ele, assim como os mineiros, os paraibanos são afetuosos. Bem parecidos com a gente, sem falar da hospitalidade.



Luís também gosta muito de ajudar as pessoas, acha que fez a escolha certa pela profissão, sente que está contribuindo para alguém aprender algo.



- Sempre tive um viés muito didático. Montes Claros para mim é uma cidade referencial no sentido de que todas as minhas matrizes formativas estão aqui. Muitos músicos de Montes Claros vão estudar comigo na Paraíba, isso é muito motivador, alguns professores fizeram mestrado lá.



Tradicionalmente venho à festa e aí sempre tem uma palestra - conta.






Desafios



- Acredito no poder da música como expressão artística, mas também como expressão cultural. Acho que fazendo música como instrumentista, compositor, você consegue tocar algo nas pessoas, que cada vez mais precisam ser tocadas: sensibilidade, percepção, aspectos que transcendem essa relação com o mundo físico, material, eu diria pragmático, querer saber por que estou gastando duas horas com isso, o que vou ganhar – analisa.



Com relação ao ensino, ele considera que a música oferece uma grande alternativa, uma formação ampla do indivíduo, no sentido que possibilita acesso a um tipo de linguagem bastante diferenciada, do que é trabalhar por conteúdos mais funcionais.



- Com essa sociedade capitalista, ler bem, escrever bem é fundamental, não discuto isso.



Para conhecer melhor o Luís, acesse www.luisricardoqueiroz.com.br


 

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