Rio que batuca

Cultura tradicional do São Francisco, batuque ganha filme e encontro

Lucas Buzatti
20/03/2019 às 07:41.
Atualizado em 05/09/2021 às 17:52
 (PÂMILLA VILAS BOAS/DIVULGAÇÃO)

(PÂMILLA VILAS BOAS/DIVULGAÇÃO)

“Nós deveríamos pensar no batuque como um importante patrimônio cultural de Minas Gerais”. A reflexão é da antropóloga Pâmilla Vilas Boas, que pesquisa os batuques da região do Alto Médio Rio São Francisco desde 2010. A cultura tradicional ribeirinha, que tem forte presença em comunidades quilombolas do Estado, foi abordada no documentário “A Vida é um Remanso”, cuja direção é assinada por Vilas Boas e pela cineasta Fernanda Brescia.

Além do filme, a imersão da antropóloga resultou no Encontro de Batuques do Rio São Francisco, cuja segunda edição aconteceu no último sábado, na comunidade Quilombola de Bom Jardim da Prata em São Francisco, município do Norte de Minas. O evento reuniu cerca de dez grupos de batuque e também resulta dos esforços para celebrar e perpetuar a memória da cultura ribeirinha, proporcionando a confraternização entre as comunidades da região.

Os batuques – conhecidos também como lambero, carneiro ou umbigada – datam do período da escravidão e foram a “brincadeira” encontrada pelos escravos para comunicar segredos, questões políticas e religiosas numa comunicação cifrada que fugisse da compreensão dos brancos.

Com suas caixas, roncador (espécie de cuíca ancestral), a dança do carneiro e o ritmo frenético, os grupos compartilham músicas e memórias que atravessam os tempos, numa linguagem própria.

“O batuque é uma cultura de resistência às margens do rio e às margens da história oficial que se tenta produzir nesses locais. Os batuques são uma forma incrível de produzir a memória do povo ribeirinho, apesar de todos os exercícios de apagamento”, sublinha Vilas Boas, ressaltando a mistura entre canto, dança e história. “Há uma relação forte entre o canto e a dança. A performance é marcada por uma corporalidade muito forte”, afirma.

“Já a linguagem é muito condensada, mas tem um grande refinamento, muito diferente do que observavam os colonizadores e folcloristas, que taxavam o batuque como bizarro, pobre”, completa.

Vilas Boas afirma que as músicas contam episódios de uma forma codificada, em letras que vão se transformando com o tempo. “É uma espécie de crônica sintética e sempre em transformação”, completa.

Para a antropóloga, é importante celebrar a cultura dos batuques através de iniciativas como a do encontro, que reuniu grupos como Ponto Chique, Geraes Velho, Carneiro de Bom Jardim da Prata, Buriti do Meio e Benedito Costa. “Percebi que os encontros são muito importantes para os grupos. É quando eles trocam músicas e experiências”, diz. “Além do mais, servem para chamar atenção para essa prática cultural que é muito forte, ancestral e ainda pouco conhecida”.

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