O doce veneno da música: a arte de cantar ainda seduz a muitos que se entregam de corpo e alma ao sonho de se tornar sucesso

Jornal O Norte
21/11/2006 às 11:03.
Atualizado em 15/11/2021 às 08:44

Jerúsia Arruda


Repórter


jerusia@onorte.net

Como nascem os músicos no interior do Brasil? De um modo geral, o artista é formado em várias escolas, e para garantir seu espaço no disputado mercado, não pode se furtar de nenhuma delas. Entre essas escolas, podemos destacar a banda de baile, a noite (bares), a formação teórica, ainda que seja através de vídeo-aula, e a coragem de enfrentar o palco, mesmo sabendo não estar pronto e que é lá que vai descobrir, aos poucos, como exercer a arte de tocar e cantar com um mínimo de aprovação, de aceitação.

Fabiano Gonçalves: o menino norte mineiro dá asas ao sonho de se tornar cantor


(foto: Wilson Medeiros)

Em visita à redação, o jovem Fabiano Gonçalves, de 21 anos, nos conta que veio de Itacarambi, extremo Norte de Minas, para tentar aprender um pouco mais sobre a vida, e assim, continuar seu projeto musical com um mínimo de maturidade.

Sem medo de expor, o músico diz que, antes de estudar música, de se preparar para os palcos, primeiro precisa aprender a se comunicar melhor, a usar melhor as palavras, se socializar.

- Itacarambi é uma cidade pequena e as pessoas vivem numa rotina que as priva de novidades, de crescimento. E por conviver a vida toda com as mesmas pessoas, é natural que sinta dificuldade em lidar com pessoas de hábitos diferentes. Sinto dificuldade até em conversar. Por isso me mudei para Montes Claros, onde tenho convivido com outra realidade e isso tem despertado em mim a curiosidade pelo novo, me incentivado a buscar novos conhecimentos. Já me sinto mais à vontade para me relacionar com as pessoas e isso vai ajudar no meu desempenho no palco.

Fabiano começou a cantar muito cedo, meio de brincadeira, com mais quatro amigos com quem formava o grupo Garotos Quentes do Forró. Tinha por volta de 15 anos de idade. Até que um dia se apresentaram em um bar dançante da cidade natal e tiveram boa aceitação. Pensou que poderia dar certo. Na época tinha 19 anos de idade.

- Antes jogava futebol e jogava bem. Mas a realidade do esporte brasileiro é ainda mais complicada que a da música. Tem muito olheiro, mas só quer levar vantagem. Também há muita injustiça e a distância dos grandes centros torna quase impossível chegar a um bom time, onde dá para pensar em fazer carreira. E sempre gostei de música. Quando fizemos a primeira apresentação percebi que se investisse, me dedicasse, poderia dar certo. De qualquer forma, as opções de trabalho em uma cidade como a minha não são grande coisa. Resolvi, então, encarar o desafio. Agora já me sinto mais desinibido e estou me preparando para fazer meu primeiro show de verdade – conta Fabiano, que se separou do grupo onde começou e se prepara para um vôo solo.

Fabiano diz que escolheu o repertório de acordo com a cultura local, pois é em sua cidade que pretende começar sua carreira e, segundo ele, se conseguir emplacar lá, já se dá por satisfeito.

- Vou cantar músicas sertanejas, gravadas por Leonardo e Zezé di Camargo e Luciano, em ritmo de forró. A princípio vou me apresentar com um tecladista, desses que usam o instrumento com acompanhamento eletrônico. Para incrementar o show, vou montar um cenário e algumas dançarinas para ficar visualmente mais agradável. Sei que não estou apresentando nenhuma novidade, mas o fato de manter um estilo totalmente voltado para a música sertaneja em forró talvez seja um diferencial. De qualquer forma, tenho recebido apoio dos amigos e vizinhos, e sei que pelo menos em minha cidade serei bem aceito – explica o cantor.

Fabiano Gonçalves Lameu é filho de Dona Cleuza e possui cinco irmãos e uma irmã, de quem recebe todo apoio moral e incentivo para acreditar na carreira de cantor.

- Infelizmente perdi meu pai muito cedo, mas somos uma família unida e, mesmo com toda humildade que vivemos nunca perdemos a capacidade de sonhar – diz.

Morando há dois anos em Montes Claros, onde trabalha em um restaurante como garçom, Fabiano diz que divide seu tempo entre o trabalho, as aulas de postura, não só de canto, mas também no trato com as pessoas, e os ensaios para o show que vai se chamar Fabiano Gonçalves, A Explosão do Forró.

- O show de estréia será no próximo mês dezembro, onde gravarei ao vivo meu primeiro CD. Para participar do show as pessoas terão que levar um quilo de alimento não perecível. Os alimentos arrecadados serão doados às pessoas carentes de Itacarambi – explica o cantor, que diz que tudo que arrecadar ainda é pouco, pois a cidade possui muitas pessoas necessitadas.

- Se cada um de nós fizer sua parte e tentar ajudar o próximo de alguma forma, o mundo pode se tornar melhor. Posso não emplacar como cantor, meu trabalho pode não ter o alcance que sonho, mas farei tudo que puder para ajudar meus conterrâneos, nem que seja apenas por um natal – comemora.

REALIDADE DA MÚSICA NO BRASIL

* No Brasil o espaço oferecido às bandas independentes é bem restrito. Falta apoio, falta espaço e sobra modismo. O consagrado não recebe mais adiantamento na assinatura do contrato; ele investe num selo e banca seu próprio disco, que é distribuído com o respaldo de uma grande gravadora.

* Para sobreviver, o artista diversifica suas fontes de renda, que vende perfumes, roupas e até rodas de carro. As gravadoras hoje só bancam os que ela acredita que podem vender muito, como duplas como Zezé de Camargo e Luciano e Sandy & Junior.

* O independente precisa bancar a produção do mesmo jeito, mas a divulgação e venda podem ser feitos através da Internet, hoje um importante divulgador e vendedor de música, através de sites como My Space, Trama Virtual e iTunes. A Internet facilita o contato de consumidores de gêneros menos populares com suas preferências. Quem gosta de música barroca com viola de gamba, por exemplo, antigamente penava para conseguir alguma coisa, hoje existem até comunidades no Orkut sobre o assunto.

* A administração do direito autoral hoje depende de menos intermediários que antes, com a possibilidade de acordos diretos através do Creative Commons, onde o artista determina os casos em que sua obra pode ser usada de graça ou sob pagamento. De acordo com o site, já existem 140 milhões de licenciamentos pelo Creative em 50 países, entre eles o Brasil.

* O consumidor atual de música deseja portabilidade (poder tocar a música em qualquer mídia); participação (intervir nas músicas, poder remixar); catálogo (maior número possível de músicas disponível, nada deve ficar fora de catálogo); e preço (o mais barato possível por fonograma).

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