Glorinha MameluqueAdvogada e escritora

Olhos da vida

Publicado em 06/03/2024 às 20:06.

Sigo a Raja Gabaglia e entro no Hospital Madre Tereza. Minha neta Catherine é médica residente lá. Mas, invisível percorro os corredores e me vejo no Box 11, no leito 11, ocupado por Antônio. Foi esse o meu sentimento ao ler com sofreguidão, o livro de Karla Celene, “Antônio, olhos da vida.”

Tudo já havia começado em Francisco Sá, quando ele tinha 11 anos e Kenny Vanessa, sua esposa, 10. Tanto que ao ser feita a lista para os pares da quadrilha da escola, ‘na varanda da casa amarela, papel almaço e caneta a mão, a estudante lançou o primeiro par: Antônio Carlos e Kenny Vanessa.” Mas agora, o sofrimento e a dor perpassam os dois. A irmã Karla escreve a história pontilhada de música e poesia; a irmã que se torna o braço forte, o colo, na jornada de desespero e dor: a UTI, as hemodiálises, o encarceramento, a traqueostomia e tantos outros procedimentos. sentindo as mesmas dores, o mesmo desespero e a mesma esperança de que tudo vai passar e a vida voltará ao normal.

Ao menor gesto de recuperação, é a esperança que está ali no coração das duas, dos filhos e de toda a família e amigos. Mas a poeta Karla, de passeio na praia, compara um simples movimento da mandíbula do doente, como ‘a onda do mar’.

A fé é irredutível, pois ele prometeu ao filho Felipe: “Filho, eu vou voltar.”

A descoberta da causa traz um novo alento, mas a luta continua. Kenny Vanessa foi a grande heroína dessa história: forte, determinada, corajosa, até as forças ameaçarem deixá-la, mas aí aparece Karla para levá-la a pequenas viagens, para espairecer.

. Cada dia uma pequena vitória: a saída da UTI para o quarto, a força da música culminando com a ‘Segunda musical’, os áudios recebidos...

A cada página, uma emoção, mas não resisti com a chegada de Tony à sua casa de ambulância depois de 164 dias no Hospital, recebido com faixas, músicas e flores. Voltou-me à mente a chegada do meu esposo, de ambulância, para morrer em casa. Mas a situação é outra: começa um novo ciclo de recuperação. Apenas não poderia ver, mas é ele mesmo que diz: “Melhor ficar cego, que surdo. Como poderei viver sem música?”

“E agora, José”, ele diz um dia. Agora ele volta ao mercado de BH onde conhece de cor as escadas, as bancas e Kenny Vanessa descobre na dor um modo de transpô-la para a arte, como uma terapia que revela a artista que ela é.

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