‘Crimes’ contra pacientes, planos de saúde e SUS

Sandra Franco, consultora
03/08/2017 às 23:00.
Atualizado em 15/11/2021 às 09:54

Uma cena muito comum nos hospitais e clínicas brasileiras pode se tornar crime: a autorização prévia para atendimento de urgência e emergência. No último dia 12 de julho, o Senado Federal aprovou um projeto de lei que veda e enquadra como crime a exigência de autorização prévia de operadoras de planos de saúde para atendimento de casos de urgência ou emergência. A proposta prevê pena de detenção de três meses a um ano, além de multa. Se a recusa de atendimento resultar em lesão grave ou morte, o tempo de detenção poderá ser aumentado em metade ou triplicado.

Para os serviços de pronto atendimento, cria-se a necessidade maior de serviços de triagem. Uma classificação de risco do paciente mais eficiente permitirá aos serviços de urgência e urgência a defesa diante de alegações infundadas de pacientes e familiares. Lamentavelmente, há aqueles que sabedores da criminalização da exigência de autorização, poderão tentar aproveitar-se de condições já sabidas de atraso de pagamentos e quiçá da ausência mesmo de plano, como ocorreu quando da proibição da exigência de caução para a realização de atendimentos.

Como em qualquer crime tipificado no Código Penal Brasileiro, será necessário instaurar um inquérito policial e a ação da equipe médica e do estabelecimento hospitalar deverá ser apurado, antes da aplicação de qualquer pena ou sanção.

Tal medida, se aprovada visa barrar a prática de hospitais e clínicas que tratam a vida comercialmente. Ainda que nossa sociedade seja capitalista, em que se visa sobretudo o lucro, a saúde deve ser vista como um bem social e coletivo a ser priorizado a qualquer custo. O paciente não deve ser enxergado somente como cifras, em especial ao ingressar em um hospital entre a vida e a morte.

O projeto aprovado pelo Senado também prevê que deverá responder pelo crime o representante, funcionário, gerente ou diretor dos planos de saúde ou da unidade de saúde que condicionar o atendimento à prévia autorização dos planos de saúde. A proposta também estende a punição a qualquer outro tipo de condição para o atendimento de urgência e emergência, como a exigência de cheque-caução ou nota promissória.

No relatório dos senadores, fundamento utilizado para apresentar o projeto de lei, foi ressaltada nota técnica encaminhada pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que descreve as autorizações prévias como mecanismos de regulação aceitos no mercado de saúde complementar, desde que não impeçam ou dificultem o atendimento em situações de urgência e emergência.

Logicamente, no papel, o texto impressiona e pode ser uma forma populista de se resolver um problema maior que é a precariedade no atendimento nos hospitais de portas abertas do SUS. Fato é que as punições demorarão a chegar. A responsabilização criminal e civil poderá salvar milhares de vidas todos os anos daqueles que procuram os serviços privados, mas e a questão dos públicos, os quais não exigem caução, mas acabam por trazer danos aos paciente pela demora no atendimento e a precariedade dos serviços?

Deve-se analisar com cautela essa projeto, para que ele não sirva apenas como mais um paliativo a esconder os reais problemas na saúde.
 

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