(MANOEL FREITAS)
O aumento da demanda por empréstimo junto a bancos e financeiras como forma de desafogar o arrocho no orçamento doméstico – castigado pelo desemprego em alta e a queda na renda – abre brecha para armadilhas que deixam as contas de muitas famílias ainda mais no vermelho: a propaganda do crédito fácil e sem burocracia, aliada a ação de golpistas.
Até agosto deste ano, o Procon de Montes Claros recebeu 795 denúncias de contratações irregulares de empréstimos, uma média de três por dia.
No ano passado, o órgão de defesa do consumidor registrou 1.203 denúncias de pessoas que tiveram o nome usado de forma irregular na contratação de crédito, nada menos do que 765% a mais do que em 2016, quando foram 139 casos.
Dos casos já contabilizados em 2018, pelo menos 40 estão relacionados a consignados feitos sem autorização do cliente, na maioria aposentados.
ALERTA
Nos primeiros cinco meses de 2018, o número de empréstimos consignados pulou de 4 bilhões para 30,2 bilhões, 16% a mais que no mesmo período de 2017, de acordo com dados do Banco Central.
É preciso ter cuidado com o excesso de ofertas e as letras miúdas nos contratos, alerta o Procon. “Há casos em que é constatada falha da instituição financeira e outros em que a irregularidade foi praticada por terceiros. Algumas vezes, criminosos utilizam indevidamente os dados dos consumidores para as contratações e, em hipóteses mais raras, pessoas próximas às vítimas – maioria idosos – realizam a contratação sem autorização da mesma”, ressaltou o coordenador do Procon, Alexandre Braga.
O economista Aroldo Rodrigues avalia que o crescimento na aquisição de empréstimos mostra a incapacidade do brasileiro de cuidar do orçamento doméstico. “Isso é uma deficiência na nossa educação. Não ensinamos os jovens a cuidar das finanças. Quando eles começam a ganhar dinheiro, não sabem o que fazer e acabam se endividando”.
O especialista ainda ressalta que a contratação de empréstimo deve ser a última saída para tentar quitar dívidas. “O principal é enxugar os gastos supérfluos, principalmente quando entrou no vermelho no cartão de crédito e cheque especial. Tem que ter muito cuidado com empréstimo, pois os juros são altos e acabam virando uma bola de neve”.
A dica é recorrer a empréstimo quando precisar quitar dívidas com juros maiores do que o previsto em novo contrato. Renegociar as dívidas com os credores também é um caminho.
Banco terá que indenizar idosa
Em decisão recente, a Justiça em Montes Claros condenou uma instituição bancária a indenizar uma cliente por danos morais após descontar 72% da aposentadoria dela para garantir o pagamento de empréstimo consignado.
O banco teria incorrido em um erro básico: ultrapassou o limite de 30%, estabelecido em lei, para desconto de empréstimo no salário do cliente. Além disso, não havia qualquer comprovação da aquisição do crédito pela correntista.
O caso demonstra que, muitas vezes, a facilidade na contratação pode colocar em risco os direitos do consumidor.
A aposentada é analfabeta e, segundo o banco, havia contratado o empréstimo consignado via caixa eletrônico. A cliente alega nunca ter feito tal operação e que só tomou conhecimento do fato quando os proventos passaram caíram de R$ 937 para apenas R$ 260.
A redução do valor em 72% do pagamento foi devido à contratação de duas parcelas de empréstimos, contrariando o artigo 355, do Código de Proteção ao Consumidor, que prevê o limite de desconto de 30% do total do salário recebido. A idosa foi indenizada em R$ 6 mil e mais as custas processuais por danos morais.
A advogada Suellen Vieira, que defendeu a causa da aposentada, ressalta que a prática é comum, principalmente no que se refere aos consignados –o pagamento deste tipo de empréstimo é feito todo mês, diretamente no salário ou benefício do INSS antes que o cliente receba o dinheiro.
“O contrato de empréstimo é considerado indevido quando não há durante a contratação a transparência necessária e a informação devida ou quando não são preenchidos todos os requisitos para a validade do negócio jurídico como, por exemplo, procuração pública para analfabetos”, ressalta a advogada.
“Também se considera indevido o empréstimo consignado que não obedece à margem legal, extrapolando o limite de 30%, retirando do contratante o direito da dignidade da pessoa humana”, explica a advogada.
Ela também alerta que a facilidade para conseguir um empréstimo consignado pode ser uma armadilha, especialmente em mais de um contrato por vez.