Fogão a lenha em alta

Disparada do preço do gás muda rotina de moradores e de donos de restaurantes

Manoel Freitas
Montes Claros
21/07/2018 às 07:27.
Atualizado em 10/11/2021 às 01:31
 (MANOEL FREITAS)

(MANOEL FREITAS)

No ano em que o consumidor viu o preço do gás de cozinha disparar, com aumentos até semanais, a madeira estalando no fogão a lenha virou rotina na casa de muitos montes-clarenses, especialmente na periferia da cidade, onde o valor do botijão tem maior peso no orçamento familiar.

Mas o uso da lenha em substituição ao gás de cozinha é mais comum do que parece. Até mesmo restaurantes estabelecidos no Centro de Montes Claros estão apelando para o tradicional e antigo modo de cozinhar mineiro.

Essa volta ao passado começou já em junho de 2017, quando a Petrobras alterou a política de preços do gás de cozinha, com o objetivo de pôr fim há anos de subsídio e passou a acompanhar mais de perto as cotações internacionais do produto.

Desde então, segundo a Agência Nacional do Petróleo (ANP), o botijão teve aumento de 17,36%. No dia 4 de julho, a Petrobras comunicou mais um aumento – de 4,2% a 4,6%.

Em julho, o preço médio do botijão de 13 quilos em Montes Claros era de R$ 75,29, uma alta de 21% em relação ao valor praticado em igual mês do ano passado – R$ 62,22. E acima do cobrado no Estado, que é de R$ 71,49.

Para consumidores de baixa renda, a saída é gastar o mínimo com o fogão a gás. Na Conferência Cidade Cristo Rei, o “Feijão Semeado”, que tem em comum o fato de em seus domicílios a renda ser de apenas um salário mínimo, a fumacinha saindo pelo telhado se tornou comum.

Mesmo proibida de ficar próximo a essa fumaça e às labaredas, por ser hipertensa, dona Maria Lídia Barbosa, de 79 anos, não pode abrir mão do fogão a lenha. “Aqui fora, além de esquentar a água, eu cozinho de tudo um pouco: feijão, carne, feijoada aos sábados e, aos domingos, dia de reunir a família, uso o forno para preparar frango assado. Na semana, faço biscoito e bolo”, diz. Ela conta que o gás nunca custou tanto e que já chegou a pagar R$ 80 por um botijão.
 
SALVAÇÃO
Maria de Lourdes Moura, de 70 anos, diz que “dar R$ 75, R$ 80 num gás é uma carestia, uma vergonha. É demais, por isso tenho um fogão a lenha, porque a gente que foi muito bem criada na roça sabe mexer com o fogo”.

E ele é a salvação para Maria de Lourdes, pois com ela vivem filho, neto, bisneto e tataraneto. “Ajuda muito o fogão a lenha para esquentar água para dar banho nos meninos, cozinhar feijão. Hoje só faço o básico no fogão a gás. E olha que sou até proibida de ficar aqui perto da fumaça”, ressalta.
 
CLANDESTINO
Na Feijão Semeado, o único depósito de gás é clandestino. O proprietário não tem o nome revelado, mas Brasilino Pereira dos Santos, o “Bigode”, de 63 anos, é quem faz às vezes de gerente e entregador. Segundo ele, o patrão não tem como dotar o local de maior estrutura, até porque vende por dia menos de dez botijões, e ainda assim só consegue manter uma venda razoável “porque estabelecemos o preço de acordo com o concorrente, normalmente R$ 3 mais barato”. Mas quando tem reajuste, não tem jeito, garante ele, tem que aumentar o preço.

Em Montes Claros, há 800 revendedores legalizados e outro tanto clandestino. Segundo Pedro Gonçalves da Silva, que representa o setor, os estabelecimentos não têm como manter o preço do produto com tantas altas em sequência.

“Quando vem um aumento, a gente não tem como fazer nada. Quando sai da Petrobras, a distribuidora repassa pra gente e não tem outro jeito”, afirma o presidente da Associação dos Revendedores de Gás de Montes Claros.

Venda de botijões cai até 15% após reajustes
A alta do preço do gás provocou outro fenômeno: restaurantes usando o fogão a lenha não só para dar aquele charme na produção da comida mineira, mas para economizar no produto.

Isso impactou na venda do botijão em Montes Claros. Segundo Pedro Gonçalves da Silva, representante das revendedoras, houve uma queda de até 15% na venda do produto na cidade.

“O salário não acompanha a elevação do preço do combustível”. Além disso, o consumidor está pesquisando mais o valor do botijão.

Alan Fabrício Pimenta, de 40 anos, intensificou a busca por preços melhores. “Sempre faço uma pesquisa, mas encontrei um fornecedor que sobe apenas um pouquinho, mesmo quando o preço das distribuidoras sobe mais”, revela o dono de restaurante na avenida Cula Mangabeira. Com isso, consegue comprar o botijão a R$ 65. “Vendo o quilo a R$ 29,90 e só no almoço atendo mais de cem refeições. Não aumentei o preço nem na greve dos caminhoneiros”.

Proprietária da maior revenda de gás no bairro São José, Arlete Rodrigues Batista diz que não tem como vender o botijão a menos de R$ 78 por ter que cumprir várias regras para se manter regularizada. “Vender mais barato é impossível. Meu estabelecimento funciona dentro das normas legais e de segurança, que pesam no custo final”, lamenta.

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