‘Viver a Olimpíada como torcedor é um sonho’

Em passagem por Minas Gerais, Bernardinho relembra trajetória na Seleção Brasileira

Cristiano Martins / Henrique André
Hoje em Dia - Belo Horizonte
27/02/2018 às 06:53.
Atualizado em 03/11/2021 às 01:35
 (FLÁVIO TAVARES)

(FLÁVIO TAVARES)

Ele é o treinador mais vitorioso do esporte brasileiro, com quase sessenta títulos, entre conquistas por equipes e pelas seleções feminina e masculina de vôlei. Seria um engano, porém, pensar que a motivação já não é a mesma, ou que as derrotas não rendem mais dores de cabeça. Um ano após ter deixado o comando do time campeão olímpico nos Jogos de 2016, Bernardinho veio a Minas Gerais para a disputa do sul-americano feminino, no comando do Sesc-RJ.

O treinador de 58 anos recebeu o Hoje em Dia para esta entrevista exclusiva. Cotado para se candidatar ao governo carioca, ele rejeita a possibilidade de deixar o esporte e garante que a única certeza para o futuro é a presença na Olimpíada de Tóquio, em 2020, desta vez apenas como torcedor.
 
De onde vem essa determinação mesmo após tantas conquistas?
O que me motiva não é pensar na conquista, pois ela é consequência do dia a dia. O que me motiva é a paixão por esse processo. Acordo cedo com prazer para dar treino, para tentar tirar um pouco mais das meninas. O que me motiva é descobrir um novo talento, desenvolver uma jogadora, e vê-las realizando sonhos através do esporte. Tento ser uma ferramenta nesse processo e, a cada dia, fazer um pouco melhor. 
 
Das suas passagens por Minas, a mais marcante foi a perda da Liga Mundial para a Rússia, em 2002, com a Seleção Masculina. Qual foi o impacto desse episódio na construção do time campeão olímpico?
Nós havíamos ganhado algumas competições em 2001, logo no início. Aquela derrota aqui serviu como uma grande lição. ‘Somos um bom time, estamos na briga, mas não somos favoritos a nada’. Tanto que, meses depois, jogamos a final do Campeonato Mundial contra a própria Rússia, e talvez tenha sido um grande aprendizado para que nós pudéssemos ganhar o nosso primeiro Mundial, um título que o Brasil não tinha até então. E nós abrimos uma sequência de três títulos mundiais, então foi uma vitória importantíssima, revertendo o quadro da derrota sofrida aqui. Certamente, foi uma das lições importantes que tivemos. A derrota serve para duas coisas: ou você aprende, assume responsabilidades e cresce, ou sucumbe a ela.
 
Quando entrevistamos o Giba, ele disse que a Seleção de 2004 foi um “time perfeito” e “o melhor de todos os tempos”. O que havia de tão especial?
Foi uma conjunção de talentos que gerou realmente uma equipe excepcional. Mas, mais do que isso, existia um sentido de equipe que era a coisa mais forte. Você tinha um Giovanni no banco, um campeão olímpico, que era um soldado à disposição do time. Isso demonstra o espírito que permeava aquele grupo. Mas era, sim, um time de talentos, com titulares e reservas em um nível muito próximo. Gustavo, Ricardinho, Maurício, Nalbert, Dante, Giba, Serginho... Alguns caras realmente eram o ponto fora da curva, mas o que importava é que era um time. Junta essa turma toda aí, se o treinador não atrapalhar... (risos).
 
Qual as diferenças entre as equipes e as emoções em 2004 e 2016?
Do ponto de vista pessoal, é claro que uma vitória em casa, na minha cidade, com meu filho em quadra, pesa. Mas são dois ouros olímpicos, campanhas incríveis de qualquer forma. O time de 2004 era superior em termos de talentos. O grande aprendizado de 2016 é que não tínhamos o time mais talentoso, certamente não éramos os favoritos, e estávamos sob uma pressão incrível. Talvez tenha sido a nossa geração mais resiliente. Fomos vice-campeões mundiais e fomos criticados. Dentro da Polônia, contra a Polônia, depois de três títulos mundiais. O voleibol brasileiro se tornou uma referência de tal ordem que a prata olímpica (2008 e 2012) era vista como fracasso. A prata virou uma desgraça, literalmente. Mas nós tivemos que lidar com isso. Jogar em casa, com toda aquela pressão... É algo que se deve parar, pensar e reverenciar. 
 
Você saiu da Seleção há um ano. Como tem lidado com a “abstinência” e as novas possibilidades que passaram a se abrir?
Vou sentir falta para o resto da vida. Eu não ‘estou’, eu ‘sou’ um técnico de voleibol. É isso que eu gosto de fazer. Surgem milhões de possibilidades, de perspectivas lá fora, e é muito difícil a minha decisão, porque deixar o voleibol é algo que eu não vejo como uma das possibilidades hoje. Deixar a Seleção já foi muito difícil. Mas nós criticamos tanto as pessoas que se perpetuam… E já eram 23 anos. A Seleção não era minha, eu apenas sou uma parte, uma peça daquela história. Então não seria muito correto, eu tinha que abrir espaço para os outros também.
 
Depois de seis Olimpíadas seguidas, pretende ir também a Tóquio?
Como torcedor, com certeza! Desde 1980, que foi a minha primeira Olimpíada, nunca fui para assistir. Já estou economizando para comprar um pacote e ir como torcedor.  No vôlei masculino, espero que meu filho esteja e, portanto, estarei lá torcendo como pai. Mas verei também outros esportes. Poder viver uma Olimpíada como torcedor é um sonho. Porque, nas últimas todas, só trabalhei, só trabalhei.

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