O ‘vovô’ contra a molecada

Hexacampeão mundial e agora também diretor, Mineirinho avalia skate na Olimpíada

Cristiano Martins
Hoje em Dia - Belo Horizonte
20/02/2018 às 05:40.
Atualizado em 03/11/2021 às 01:27
 (Garth Milan/Red Bull Content Pool)

(Garth Milan/Red Bull Content Pool)

Mais do que acostumado às arriscadas manobras no ar, o hexacampeão mundial Sandro “Mineirinho” Dias tem se adaptado a novos desafios desde outubro do ano passado, quando assumiu a diretoria esportiva da Confederação Brasileira de Skate (CBSk).

Presidida pelo também multicampeão Bob Burnquist, a nova gestão assumiu o comando da entidade em um momento bastante conturbado, após o Comitê Olímpico do Brasil (COB) ter apontado a Confederação Brasileira de Hockey e Patins (CBHP) como representante do skate nacional na preparação para os Jogos de 2020.

Com a resolução da crise que chegou a colocar em risco a presença das principais estrelas das rodinhas em Tóquio, o atleta de 42 anos projeta o Brasil disputando o lugar mais alto do pódio em todas as categorias, tanto no masculino quanto no feminino.

Dono de três medalhas de ouro, três de prata e uma de bronze nos X-Games (a “Olimpíada” dos esportes radicais), Mineirinho revela, inclusive, o desejo de concorrer a uma das vagas do país nesta edição de estreia nos Jogos, mesmo reconhecendo uma grande concorrência com os nomes da nova geração.
 
Você integra hoje a diretoria “menos engravatada” do Brasil. Como tem sido lidar com esse outro lado do esporte?
Para mim, é tudo novidade. Quando recebi o convite, agradeci ao Bob e disse: “olha, eu não entendo nada dessa parte”. Aí ele respondeu “eu também não” (risos). Mas tem pessoas lá para nos ajudar, que já conheciam muito bem a burocracia e o funcionamento das federações. Precisamos comprar umas gravatas para as reuniões mais importantes (risos). Brincadeira. Nós vamos do nosso jeito, com o skate debaixo do braço. Não adianta querer mudar, tentar ser diferente. Temos é que chegar lá e ter uma conversa produtiva, com embasamento. Estamos sendo bem recebidos pela maioria.
 
A disputa com a CBHP foi a motivação para montarem essa diretoria?
A nossa confederação sempre trabalhou muito, por amor e, principalmente, sem receitas. E isso já rolava há quase 20 anos. Nós sabíamos que iriam aparecer oportunistas nessa hora (entrada na Olimpíada), só que isso aconteceu até rápido demais. Por mais que a nossa antiga diretoria fosse muito respeitada pela galera do skate, não tinha um nome forte para bater na porta do COB. Por isso, resolvemos mudar e colocar nomes que têm uma importância. Com o Bob é diferente. Ele chega lá e fala “eu sou o presidente da confederação”. Na primeira semana, ele já estava reunido com o governador de São Paulo. Se não fizéssemos isso, não pegaríamos de volta nunca. Quem vive do skate era contra a CBHP. Quem é da minha geração para a frente sabe que eles nunca fizeram nada pelo esporte.
 
Você tem vontade e se vê em condições de tentar disputar os Jogos de Tóquio, aos 45 anos?
Apesar de não ser a minha especialidade (vertical), a Olimpíada terá o park, que eu também faço. Vamos ver como será a classificação. Temos uma nova geração muito forte, mas acho que eu teria condição de tentar e talvez até de disputar de igual para igual com a molecada. Vontade eu tenho. Participei da cobertura dos Jogos de Inverno de 2010, pelo portal Terra, e pude sentir o tal espírito olímpico. É realmente uma sensação diferente, mesmo se comparada aos maiores eventos do mundo.
 
Já é certo que o Brasil terá 12 vagas em Tóquio?
Estamos esperando saírem as regras e o sistema de classificação, porque isso vem lá de fora (Comitê Olímpico Internacional e World Skate). Nem nós sabemos ainda como vai funcionar a seleção. A princípio, teríamos 12 vagas, mas isso também está indefinido, porque Brasil e Estados Unidos têm muito mais representantes, então eles podem aumentar o número de vagas para esses dois países.
 
A torcida brasileira pode apostar em pódios?
Se a Olimpíada fosse neste ano, o Brasil disputaria a medalha em todas as categorias, no masculino e no feminino. E, quando eu digo medalha, é a de ouro. Temos muita gente boa. Pedro Barros, Luan Oliveira, Kelvin Hoefler, Ivan Monteiro, Carlos Ribeiro, Murilo Peres, Italo Penarrubia... Leticia Bufoni e Pamela Rosa entre as meninas... Mas, como eu disse, se fosse hoje. Daqui a dois, três anos, tudo pode mudar. Acredito que podem aparecer muitas caras novas até lá. Só espero que as classificatórias sejam bem democráticas, dando oportunidade para todo mundo poder tentar.
 
Como a comunidade do skate reagiu à entrada na Olimpíada? Houve resistência também, não foi?
Fiz parte da primeira formação do Comitê Olímpico para o skate, por volta de 2003, como representante da América do Sul. A ideia era colocar já nos Jogos do Rio, por causa da grandiosidade do skate no Brasil, e desde aquela época apareceu gente contra, falando que iria estragar, tirar a essência. Mas quem fala isso são pessoas que não dependem do esporte para viver, que não pensam como profissionais. Eu, por exemplo, já tive loja, tenho uma marca e um camp de esportes radicais para crianças. Tudo que faço é relacionado ao skate. Então, sempre acreditei que os Jogos trariam coisas positivas, mais mídia, patrocínios, público, praticantes... E o mercado consequentemente iria melhorar. É lógico que, se a Olimpíada viesse para interferir e mudar o esporte, nós seríamos os primeiros a pular fora. Vai ser legal.
 
Já pôde perceber alguma dessas mudanças positivas? Ainda vê algum preconceito com o skate?
Logo que anunciaram (em junho de 2016), aumentou a procura dos pais ligando, querendo mandar os filhos para o meu acampamento, por exemplo. Esse tipo de coisa dá uma credibilidade a mais para o esporte. Mas, se é que ainda existe algum tipo de preconceito, isso deve acontecer com as pessoas totalmente desinformadas, que não sabem que o skate é o segundo esporte mais praticado do país há mais de dez anos.
 
Você mora atualmente na Califórnia (EUA), no “olho do furacão” do skate. Existe muita diferença em relação ao Brasil?
Em um raio de 10 milhas (16 km) da minha casa, tem seis half pipe e mais umas dez pistas. Estou no centro da cena do skate vertical, a cinco milhas da casa do Bob, do Elliot Sloan e do Tony Hawk. Tem uma comunidade até boazinha (risos). Mas, sendo bem sincero, o half pipe que eu tenho no Brasil não deixa nada a desejar em comparação com os do exterior.
 
Você nasceu em Santo André (SP). De onde veio o apelido “Mineirinho”?
Meu pai é mineiro, por isso um tio me chamava assim. Quando fui participar do meu primeiro campeonato, tive que preencher uma ficha e colocar um apelido. Eu disse “não tenho”, mas minha mãe falou “coloca Mineirinho mesmo”. No segundo campeonato, o apelido já tinha pegado.

“Para mim, é tudo novidade. Quando recebi o convite, agradeci ao Bob e disse ‘olha, não entendo nada dessa parte’. Aí ele respondeu ‘eu também não’. Precisamos comprar umas gravatas para as reuniões mais importantes (risos)”
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