Um artista de múltiplos sucessos enriquece o Psiu Poético

Jornal O Norte
10/10/2005 às 11:45.
Atualizado em 15/11/2021 às 08:53




O Psiu poético deste ano tem um toque especial com a presença do pluriartista Jorge Salomão. Escritor, designer gráfico e compositor de vários sucessos da MPB, Jorge Salomão surpreendeu e chocou o público, na última quinta-feira, 06, com a leitura de 30 poemas de sua autoria, numa performance dionisíaca, onde corpo e palavras se confundiam.




E na sexta, 07, participou de uma mesa redonda ao lado de Toninho Vaz, que lançou o livro Pra mim chega: a biografia de Torquato Neto, onde discutiram o tema O global e o local na experiência poética. Além de enriquecer o debate com seu vasto conhecimento de mundo, o pai de João Jóia fez a leitura de alguns poemas, sempre surpreendendo, sem ferir aos desavisados.

 




Jorge Salomão diz que burocracia atrapalha gestão do ministro


Gilberto Gil (Foto: Adriana Queiroz)






O MALABARISTA






Um dos escritores brasileiros mais importantes das últimas décadas, esse baiano de Jequié, 59 anos, escorpiano, diz escrever uma poesia sem poesia e que, na verdade, nem se considera poeta:




- De modo geral, meus poemas trabalham a dormência, o oposto do que faço. Sou malabarista.




Jorge escreve todo dia, sem o compromisso de ser escritor e desde criança tem mania de anotar tudo. Diz que sente necessidade de ficar inventando e reinventado o tempo todo.




- A idéia do indivíduo não é ficar parado. É o movimento. Estou sempre de bloco e lápis na mão e anoto meus pensamentos, minhas idéias. Aproveito depois em várias coisas - diz.




CIDADÃO DO MUNDO




Depois de três anos em Nova York trabalhando como designer gráfico, produzindo capas de disco, Jorge toma um susto ao retornar a um Brasil onde tudo estava acontecendo ao mesmo tempo.




- Fiquei meio pirado. Era começo de 70. Além de o país estar muito diferente, tinha acabado de me separar de minha mulher e fui ao ponto zero. Que é ótimo, pois é quando começa tudo - relembra.




Assim que chegou, Jorge rapidamente se enturmou e começou a produzir capas de disco para artistas como Vinicius Cantuária e Dulce Quental. Depois, produziu cenários para shows de Lobão, Marina, Jorge Mautner e Dorival Caymmi.  




Todo mundo me chamava. Eu estava tão metido com isso! - ironiza.




Mesmo sendo muito requisitado e fazendo um trabalho de que gostava, Jorge diz que se sentia meio vazio:




- Eu adoro desenhar. Sempre escrevi na minha vida. Mas achava que tudo que fazia não rolava muito. Eu sempre falava isso com meu irmão (Wally Salomão), e ele falava que era piração minha. Ele já estava meio encaminhado com a coisa de música e eu não me situava muito nisso.




Um Jorge irrequieto trabalhava como repórter e fotógrafo para uma revista e, numa entrevista na praia com Os Paralamas do Sucesso, teve um encontro com o cantor e compositor Nico Resende, que resultou na composição de Noite, seu primeiro grande sucesso, gravado por Zizi Possi. Estourou geral. Depois fiz Pseudoblues, no mesmo dia.




- A Marina gostou e botou no disco Virgem.  Noite me deu um reconhecimento maior e Pseudoblues me deu um certo respeito, esse respeito brasileiro que é até meio cafona. Foi na época em Cazuza já estava muito doente e o Frejat precisava de um parceiro e me convidou. Juntos, fizemos Fúria e folia, Supermercados da vida, Comendo vidro e muitas outras composições. Aí comecei a compor pra valer e, desde então, tenho feito parceria com vários outros artistas.




LITERATURA




Dono um texto concentrado, sem excesso de palavras, Jorge Salomão publicou quatro livros: Mosaical, Olho do tempo, Campo da Amérika e Sonoro. Em andamento estão Exato pensamento, Conversa de mosquitos e Campo minado de flores. Já em fase final, Jorge produz o CD Cru tecnológico, que é a gravação de textos, com mistura de vozes e a participação de vários músicos.




PSIU POÉTICO




Famoso por sua natureza efervescente, em suas apresentações no Psiu poético, Jorge diz ter sido muito concentrado e cauteloso, respeitando as tendências:




- Mas o que faço é fragmentado, energético e dificilmente não choca.




Pela primeira vez em Montes Claros, diz que o clima quente é bem parecido com o de sua cidade natal e que foi amor à primeira vista. Sobre o Psiu:




- Palmas para Aroldo Pereira. Imbatível. Tem vitalidade e aquela coisa da eletricidade, do movimento. No mundo tem muita gente lerda, fragmentos caindo aos pedaços. Você encontra gente lerda que parece que está fora de tudo. E com Aroldo você vê a vida fluir. Ele influencia todo o projeto. Não gosto muito de poesia, mas adorei as coisas que me apresentou. Não gosto de gente que chega querendo uma atividade como se fosse uma coisa de funcionário, me dá angústia. A rebelião é uma coisa muito boa. O Sartre dizia que a gente só aprende contestando. E o Psiu poético tem isso.




REENCONTRO




Depois das muitas experiências pessoais e profissionais, Jorge diz que vive hoje em busca de uma autodefinição. Filho de artistas e criado em hábito democrático de vida, se diz indignado com as contradições no Brasil:




- Na área cultural, é um fiasco. Entra governo, ministro, ninguém faz nada. (Gilberto) Gil é um grande artista, mas como ministro da Cultura não fez nada. Não tem jogo de cintura. As pessoas estão afogadas na burocracia e cultura não tem nada a ver com burocracia, é mão na massa. Essa coisa de falta de verba é texto velho, todo mundo já sabe. Podia ser tudo melhor. Mas isso não invalida a capacidade de estar sempre gritando por melhoras, por abrir caminhos, por tudo. O Brasil só vai dar certo no dia em que fizermos uma revolução cultural.



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