Operário do rock: músico, cantor e compositor Wagner Black fala de suas andanças

Jornal O Norte
01/02/2007 às 11:14.
Atualizado em 15/11/2021 às 07:57

Com mais de 25 anos de carreira e se preparando para gravar o segundo CD, o músico, cantor e compositor Wagner Black fala de suas andanças, suas inspirações da energia vital que vem da música e das dificuldades e falta de apoio para o artista norte-mineiro




(foto: Manoel Freitas)

Jerúsia Arruda


Repórter


jerusia@onorte.net

Uma iniciativa corajosa: cantar rock no sertão norte-mineiro. Esse é o trabalho – talvez seja melhor dizer a missão - de Wagner Black, que diz que a música tem o código certo para dar sentido e fazer as coisas acontecerem em sua vida.

Com olhos pequenos e fundos, que denotam inteligência aguçada – apesar de começar a entrevista fazendo menção a Charles Chaplin: o que sei é uma gota; o que não sei, um oceano – e uma certa melancolia, Roberto Wagner Pereira, 43 anos, diz que foi iniciado na música pelos sons da natureza: o burburinho da água, o canto dos pássaros, o barulho dos bichos.

- Tive uma infância tipicamente sertaneja: pobre, simples, mas feliz. Mas sempre fui ligado a movimentos que envolvem a música. Mesmo vivendo no interior mineiro, na adolescência já conhecia o som que vinha do outro lado do oceano: Jimmi Hendrix, Janis Joplin, Beatles, Rolling Stones, e também tinha paixão pela música nordestina, como Banda de Pau e Corda, Amelinha, Geraldo Azevedo e tantos outros. Naquela época, a música era o sonho de 10 entre 10 adolescentes – relembra o músico, que aos 22 anos compôs sua primeira canção, movido por uma profunda dor de cotovelo.

- Comecei cantando música regional, mas o rock acabou tomando conta das minhas idéias. Desde a primeira vez que cantei, adotei o estilo que até hoje é a base do meu repertório. A primeira música que compus já tinha toda a formatação de rock na construção harmônica e melódica e a mesma irreverência na letra. Nunca consegui compor em outro estilo – diz o cantor, cuja composição tem como tônica o humor e uma certa rebeldia.

Apesar de ter moldado sua música nos palcos, Black diz buscar na teoria uma base para sedimentar seu som.

- Estudo violão clássico, canto lírico e percepção musical no conservatório estadual de música Lorenzo Fernandez e a apreensão da técnica tem facilitado meu desempenho como compositor, já que passei a conhecer melhor as linhas harmônicas, e também como cantor, por me ajudar a conhecer e explorar melhor minha capacidade vocal. É muito bom quando se tem a oportunidade de aliar a experiência prática à teoria – explica o cantor, que já está há mais de 25 anos na trilha da música.

O som sarcástico e corrosivo, aliado a uma performance hardcore e adrenalina que quase dá choque, faz de Wagner Black um símbolo da música underground produzida na região. Acompanhado de Charles (bateria), Bida (baixo) Neguin e Djalma (guitarras), o músico gravou seu primeiro CD (Mister Wagner Black) em 2002, com oito faixas, sete delas autorais, e é figurinha carimbada nos eventos de garagem em Montes Claros.

- Apesar de levar a sério, manter uma rotina de ensaios e ter sempre uma novidade para o público, falta espaço para mostrar nosso trabalho. Tem muita gente produzindo eventos, organizando shows, mas nunca tem verba para o artista da cidade, que canta rock. É interessante como sempre ouvimos o discurso de promoters de que é preciso resgatar o rock´n roll na região, que tem muita gente produzindo boa música por aí, mas na hora de contratar, não tem cachê; aliás, não tem nem água mineral para nos servir no palco. Então ficamos num impasse: ou nos sujeitamos, ou ficamos de fora. É vergonhoso e ultrajante – desabafa Black, que diz que mesmo tendo escolhido um som difícil para a cultura da região, as pessoas lotam os shows, cujos convites nem sempre são baratos, e mesmo assim, os contratantes dizem que não têm lucro e que estão dando uma oportunidade para que possam mostrar seu trabalho.

Apesar das dificuldades o cantor se prepara para entrar em estúdio no próximo mês de março para gravar o próximo Cd.

- Serão 11 faixas autorais e vamos tentar fazer uma gravação bem produzida para que possa chegar às rádios com menos dificuldade. Abaixo de Deus, o músico da região só pode contar com sorte, pistolão e grana para conseguir espaço. Como só temos sorte, vamos investir na qualidade do trabalho e contar com ela para abrir caminhos - lamenta o músico e diz que apesar de parecer levar uma vida de excessos, o único deles é o de ouvir o próximo pedindo socorro.

Irreverente, mas com humildade e fidalguia lapidadas pelas agruras e prazeres da arte, o pai de Gabriel (6) e Roberta (5), diz que enquanto não consegue ganhar dinheiro com sua música, vai vivendo de uma outra paixão; a leitura:

- Sou viciado em leitura e desde 1978 mantenho uma loja de venda e troca de livros. É uma forma de partilhar essa minha paixão com as pessoas, oferecendo não só conhecimento, mas também o sonho, o lúdico, que só a literatura é capaz de proporcionar. Juntando a isso, é também a forma que encontrei de sustentar minha família – completa.

Sobre sua música, Black diz ser um deleite e um fetiche para si a para os que dela se nutrem.

- A música, em todas suas vertentes, suaviza a vida e embala sonhos, por isso convido aos promotores de evento, à administração pública e a todas as pessoas para conhecer de perto o trabalho dos músicos da cidade e que abram os olhos e ouvidos para perceber o valor e a verdade que tem em cada um deles – desafia.

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